Na semana passada minha mãe saiu de um exame cardiológico de rotina e foi direto para um hospital. Lá, os médicos lhe implantaram um marca passo de demanda. Tudo correu relativamente bem e em breve, ela deverá também dar uma garibada em uma válvula cardíaca. Os médicos dizem que o coração dela ficará melhor que antes. Estou, claro, torcendo muito pra isso!
Cabe a nossa família acreditar, afinal a tecnologia aplicada as ciências biológicas – em especial ao ramo da performance humana já deu provas de ser algo fantástico. Os atletas de alta perfromance ao redor do planeta que o digam. Isso me fez pensar nos Jogos Paralímpicos, que tenho acompanhado a distância e com crescente interesse desde 1988, depois dos Jogos Olímpicos de Seul. Todo atleta paralímpico tem uma hisória de superação de dificuldades brutais, algumas vezes impensáveis para um ser humano médio. Para aumentar meu interesse, adicionando relevância local e especialidade, temos até grandes estrelas brasileiras na natação paralímpica, como o Clodoaldo Silva, Daniel Dias e o André Brasil. Contudo, para mim, as provas de atletismo são as que mais mostram exemplos reais de uma possível convergência do homem e tecnologia, para criação de algo maior e talvez novos limiares de performance.
Ainda que todo esporte possa parecer pequeno e nossas conquistas atuais acanhadas, em comparação com as previsões de “super inteligência” feitas por gente como o Ray Kurzweil, na teoria da singularidade, uma coisa é certa: Os Jogos Paralímpicos, começados muito modestamente por veteranos da Segunda Guerra, tem se tornado algo cada vez mais interessante. A se julgar pelas arquibancadas cheias, pelo grande número de patrocinadores nas arenas (nas Paralimpíadas isso pode) e pela crescente atenção da imprensa, isso só pode se tornar algo ainda maior no futuro.
Já há quem diga (apesar das discussões ferozes e da polêmica) que do ponto de vista bio-mecânico, membros artificiais podem garantir resultados de corrida “artificialmente mais velozes” que membros naturais, ainda que isso não possa ser provado estatísticamente. No ritmo atual de evolução tecnolócica e científica , talvez vejamos atletas ditos “com necessidades especiais” correndo, saltando (e quem sabe nadando?) – mais rápido que os melhores atletas olímpicos ainda neste século. Assim, talvez os jogos paralímpicos do futuro se tornem a arena mais performática do esporte mundial, testando os limites não apenas do corpo humano, mas também a criatividade e tecnologia disponíveis.
Mas a discussão não é simples. Anos se passaram e ainda há polêmica na IAF e no COI sobre as próteses do atleta Sul Africano Oscar Pistorius – semi finalista olímpico nos 400M e finalista do 4×400 e chamado até de “mutante” neste longo e interessante artigo da revista Piauí.
E tem mais: As reclamações do Pistorius depois da derrota paralímpica nos 200M T44 para o brasileiro Alan Fonteles, me deixam a impressão que as regras complexas e diferenças individuais sutis entre competidores na mesma categoria podem deixar pano para manga.
Para siplificar o problema, será que vamos ver uma categoria paralímpica “Aberta” na qual o uso da tecnologia seria ilimitado, com o objetivo apenas de maior velocidade, força, energia – maximizando os resultados? Lembro que nas competições de lanchas offshore havia categorias (as mais perigosas) em que os barcos/bólidos podiam gerar ilimitada potência. Será que um sitema cardio-vascular artificial pode ser eventualmente mais eficiente que o biológico? Ética e moral tornam difícil que isso seja testado logo numa disputa entre corpos humanos… mas pode ser que haja algum espaço futuro para disputas singulares… Afinal de contas, o público tem mostrado interesse em quebras de recordes, ainda que por meios “artificiais”, como foi por um tempo o caso do malogrado uso dos trajes tecnológicos na natação.
Apesar de ser também tecnologia, não vou nem entrar na polêmica do uso de doping, pois já tratamos disso aqui e sou contra qualquer artifício que coloque em risco a saúde do atleta e o futuro do esporte ao mesmo tempo. Trapacear é sempre errado e não tem lugar numa disputa esportiva. Mas o que seria trapaça quando a inventividade humana é o limite (ou a falta deste)? Não sei, mas acho que vamos debater mais estes assuntos num futuro próximo.
Obviamente, sou mais liberal quando se trata do ser humano “trapaceando” a morte e melhorando a qualidade de vida. Com isso, espero que minha mãe e todos aqueles que precisem, tirem completo proveito da tecnologia a disposição hoje para turbinar seus corpos. Acho que minha mãe não visa vantagens competitivas com o projeto de coração novo dela, mas vai ficar muito feliz de poder continuar correndo por aí com os netos. E pra falar de tecnologia trapaceando a morte, não precisamos nem falar de aparelhinhos inteligentes e corações artificiais… Descobertas com mais de 100 anos como o saneamento básico, a purificação da água e o uso de certos medicamentos anti-inflamatórios poderiam salvar milhões de vidas todo ano. “Alta tecnologia” para ganhar uma disputa é um tema diferente em outras partes do mundo que vivemos.
Eu espero melhoras para sua mãe.
Com relação às paralimpíadas, minha maior dificuldade para acompanhá-las é minha ignorância quanto às categorias.
Valeu, Renato.
Estou com ela aqui, acabou de sair da UTI e agradece os votos de melhora!
Quanto as categorias, real.ente bem complexo esse tema e difere por esporte… Vale estudar… Ou não…
Ética, motor da vida.Viver é escolher.É valorar.É medir e optar. Não há como fugir dessa lógica. Em outras palavras, não há como viver se ética. Pois ela é o conjunto de valores e perspectivas que utilizamos para dar conta dos problemas existenciais. Sempre presentes.
Quatro situações você retratou de formas diferente em relação entre a máquina e a vida. Resumidamente o homem é um animal consumista por natureza, e busca-se chamar este ou aquele afeto de mais natural, escondendo-se por trá de cada naturalização uma longa cadeia de luta social e ideológica. Uma luta por poder e dominação.Vivemos na sociedade de consumo.O consumo e os afetos são como carne e unha, pois é na exploração dos afetos que o consumo sobrevive.”Ser idoso é ter o privilégio de viver uma vida longa, de sonhar e fazer planos, de renovar a vida a cada novo dia que começa.”
Reflexões diversas. Diversos pontos de vistas. Esta é a arte de educar. Pronto restabelecimento para sra. sua mãe.
Obrigado, Rosely! O fetiche do consumo (da mercadoria?) é realmente algo que poderia ser melhor explorado nesse contexto esportivo… De repente a oposição dessa abordagem vs algo de psicologia evolucionista devem ser interessantes. Fica pra uma próxima reflexão. Abraços!
Querido, melhoras rápidas à mamãe, que bom que deu tudo certo!
Parabéns pelo lindo texto, beijos à família,
Cris Calderon
Obrigado, Cris! Tudo sob controle aqui… e continue visitando o Epichurus! Bjo
Munhoz, muito interessante a parte que você prevê que graças a tecnologia eventualmente podemos ter performances superiores na paraolimpiada do que na convencional! Nunca tinha pensado nisso! Embora ache exemplos de vida, nao me interesso muito por essa competição. E nao entendi porque mudar o nome de paraolimpiada para paralimpiada! É convenção mundial ou coisa de brasileiro? Até porque nao existe Limpia! Só Olímpia!
Ahh, e bom saber que sua mãe recebeu alta! Mande um beijão pra ela!
Valeu, Lelo! Acho que o evento vai crescer em relevância com a melhora dos resultados. Tem uns caras indo muito bem hoje e a tecnologia aplicada só deve ajudar… Quanto ao nome “novo” aparentemente é para não confundir com jogos olímpicos… Algumas curiosidades aqui: http://noticias.br.msn.com/mundo/story-bbc.aspx?cp-documentid=253507122
Abraços!
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