(Perdão ao leitor contumaz, mas esse texto não é sobre natação. Por outro lado, também não estou “roubando” os tradicionais posts de segunda e quinta. Hoje é sábado.)
Se eu pudesse escolher um show do Caetano para ir ontem, eu escolheria um dos três que mais gostei: o “Estrangeiro” que vi em Parati Angra (destaque para meia lua inteira), o “Circuladô vivo” do Vale do Anhangabaú (aquele do Debaixo dos Caracóis dos seus Cabelos) ou um que teve no aniversário de São Paulo na esquina da Ipiranga com a São João circa 1994.
Aí o leitor atento faz as contas e descobre que por ocasião desses shows eu tinha em torno de 20 anos. Pois então, dada a mesma oportunidade tipo máquina do tempo de escolher um show do Caetano para ir, a minha tia deve optar por assistir o “Tropicália”, alguém pouco mais novo que ela escolheria “Transa” ou “Bicho”, talvez minha irmã escolhesse o Velô, ou seja, cada um escolheria o show no qual pudesse ter sua juventude de volta.
Infelizmente, essa opção não estava disponível ontem, e os caracóis dos meus cabelos nem existem mais. Para ontem, a opção era o Abraçaço.
Tudo tem uma primeira vez: em nome do passado e louco para ouvir as canções antigas, comprei o ingresso e encarei pela primeira vez na minha vida um show do Caetano sem conhecer as canções do novo disco. Já fiquei meio cabreiro quando li no Jornal de manhã a crítica que publicava o set list e reparei que eu REALMENTE não conhecia a maioria das canções.
É claro que ver Caetano ao vivo cantando “Alguém Cantando”, “De noite na cama”, “Lindeza”, “Escapulário” ou “Eclipse Oculto” por si só já valeria o ingresso (eu dispensava “Triste Bahia” e trocaria por qualquer outra de “Transa”). Mas que Caetano antigo é espetacular todo mundo já sabe! Estou aqui para falar justamente da outra parte, a parte do disco novo (e deixo o melhor para o final).
Pois foi com grata surpresa que descobri que o disco novo é muito bom! É raro a gente gostar de canções logo na primeira audição, e isso ocorreu hoje várias vezes. Eu já sabia (pelos jornais) que Caetano estava com uma banda bem mais nova e com uma sonoridade diferente, eu só não sabia que o sujeito continua fazendo canções sensacionais! Logo de cara “A Bossa Nova é Foda” mostrou que a sonoridade é moderna, mas o talento é o de sempre. Uma guitarra seca e distorcida, um baixo ultra rítmico e uma bateria super criativa. A voz está intacta (ao contrário da voz do Gil, que me dá aflição a cada fonema).
Em seguida, a canção que dá título ao show, a qual recomendo para todos que não conhecem o CD e que ao ler esse post ficaram curiosos. Senti uma forte semelhança com “Eu sou neguinha?”, mas com roupagem nova, você também achou?
Das que curti de cara destaco ainda “O Império da Lei” e “Quero ser justo”, super melódicas, que fora a sonoridade modernosa poderiam ter sido feitas pelo Caetano da minha (nossa) juventude. A homenagem a Mariguela “Um Comunista” chega a ser tocante mas é um pouco longa demais e meio chata, já o “Parabéns” é muito criativo, trata-se de um email de parabéns que Caetano recebeu e musicou.
Nas palavras de “Funk Melódico” e “Estou Triste” Caetano mostra que a vida não é só sorrisos. Nesta última ele declara que “o lugar mais frio do Rio é o meu quarto”, mas no entanto, canta essas palavras com alegria contagiante. Ele parece muito feliz de estar no palco com três jovens, mesmo cantando letras tristes. Rebolou. Quase tirou a camisa. Insinuou transar com o violão. Apesar do cabelo 100% grisalho, parecia estar contente e foi convincente ao passar a imagem do jovem no corpo de velho.
Deixo para o final a minha tristeza por ele ter escolhido a fraca “Tieta” para o bis (não é possível que dentre todas as pérolas que Caetano compôs ele teve que escolher uma que rima “eta”com “Tieta”!), e fechado o show com uma chata canção do disco Cê “Outro”.
Já a dupla de canções das antigas que fechou a parte pré-bis valeria o ingresso novamente. Primeiro, a inspirada “Reconvexo” (no link com a versão 2013 no Circo Voador RJ), que é mais conhecida na voz da Bethânia e que contou com o detalhe dos suspiros da platéia na hora do “quem não rezou a novena de D. Canô“, falecida recentemente. Por último, o auge. “Você não entende nada” foi de lavar a alma. Tanto quanto a Bossa Nova, “Você não entende nada” é Foda! Cantando “Eu quero é ir me embora, eu quero dar o fora, e quero que você venha comigo“, Caetano literalmente convida a plateia a continuar acompanhando suas incansáveis revoluções. Espetáculo.
Findo o show, ficaram duas certezas. Uma que o sujeito se reinventou mais uma vez, e com sucesso. E outra que se um dia em um futuro distante perguntarem a um dos (surpreendentemente vários) jovens que lá estavam qual o show do Caetano que gostariam de revisitar a resposta será: “Abraçaço”.
E você, se pudesse qual show (do Caetano ou não) você escolheria para assistir?
Acho que só vi um show do Caetano, em Angra dos Reis (acho que vc estava comigo) e não gostei muito. Era Velô? Não me lembro. Mas o artigo está show! Devia mandar para algum jornal publicá-lo.
Putz, podicrê, era Angra, vou corrigir. Era o “Estrangeiro”, Reveillon 1989/1990.
Muito bom o post! Sempre gostei de Caetano, mas acho os últimos 20 anos ou mais dele um porre! Bom saber que voltou a fazer coisa boa!
E pra mim nao da pra escolher um show. Teria que ser dois: Circuladô com ele cantando Jokerman do Bob Dylan e o imbatível Transa, abrindo com Maria Bethânia, a música, nao a irmã! (Mesmo sabendo que essa música nao faz parte do disco)
Lelo, você confundiu o nome do show, Transa é de 1972. Talvez o Prenda Minha?
E esse do Jokerman é o mesmo do dos Caracóis. Muito bom mesmo.
Eu liguei o show ao nome do disco. Meus dois discos favoritos do Caetano são Transa e Circuladô de Fulô!
“Transa” é realmente sensacional, só tem uma música chata, e foi justamente a que Caetano escolheu para o show! 😦
Qual? Eu chutaria que você não curte Neolithic Man. Nao é uma das minhas preferidas, mas até acho legal!
NM é tois. A que ele cantou foi Triste Bahia.
Putz…eu curto bastante TB!
“Maria pé no mato é hora…
Arriba a saia e vamo-nos embora…”
Legal o post! Um pouco diferente para o Epichurus, mas certamente deveria inaugurar uma nova categoria! Achei boa a nova música, que ouvi imediatamente, mas apesar do esmero no arranjo, não me magnetiza como fazia a poesia do Caetano dos 70…Talvez seja eu o problema.
Mas a verdade é que eu gostava mais do Caetano, antes de ler Verdade Tropical, que achei pedante, apesar do eruditismo. Ainda ouço muito o cara e sou grato pelas inúmeras músicas ligadas a minha história, mas não é a mesma coisa. Dos shwos que vc citou, ficaria provavelmente com Circuladô, se bem que Transa deve ter sido dado um show sensacional…
Abraços e espero que venham mais dessas críticas!
Opa, não dá para uma canção que você ouviu hoje pela primeira vez competir com outra que lhe fez história nos bons tempos, se bem que Caetano dos anos 70 você deve ter ouvido bem mais tarde.
E eu gostei muito do livro Verdade Tropical! Concordo que seja um pouco pedante, mas não me incomodou.
Gosto muito da obra de Caetano, ao contrário das meninas aqui de casa. Assisti somente um show dele ao vivo, na Pedreira Paulo Leminski durante um evento da Anistia Internacional. Havia vários artistas, o show dele foi chatíssimo enquanto o do Gil foi espetacular. Um chegado próximo num momento gritou: “Caetano, canta Caetano! “. Só músicas desconhecidas de melodia arrastada. Tenho dvd do Prenda Minha. Acho excelente. Admiro demais este artista e seu legado para a cultura nacional. Belo post. Viva Caetano!
Legal Esmaga, concordo com tudo, inclusive com a capacidade desse artista em fazer shows “chatíssimos”. “Prenda Minha” é o seu maior sucesso comercial. Abraçaço procê.
Massa o texto Cordani. Também gosto mais das músicas e discos antigos, mas o que eu acho bem legal no Caetano é a ousadia de se arriscar musicalmente, saindo da sua zona melódica de conforto ( o Cê que não é dos meu preferidos é um disco de rock). Tipo tem várias músicas novas, que não tem cara de Caetano da época mais conhecida e não deixam de ser interessantes. A respeito de gostar na primeira audição, pode ser bom ou ruim, para um show com certeza é melhor, mas para a longevidade do som as vezes é prejudicial. Amplexos aos ephicuristas.
Valeu Rena, boa observação quanto ao lance de gostar na primeira audição. E realmente, trata-se de uma grande coragem e ousadia. Aliás “coragem” é um adjetivo que se aplica muito bem ao cantor, desde que saiu pela primeira vez da sua zona de conforto em 1967, quando foi elogiado como um ótimo seguidor da Bossa Nova pelo disco Domingo) mas resolveu “quebrar tudo” com o Tropicalismo. Grande abraço!