Este post é sobre como um bando de nadadores amigos e um velho filósofo grego me ajudaram a refletir sobre um assunto antigo: Será que é possível ter equilíbrio pessoal e profissional e alcançar alguma felicidade? Tenho a teoria pessoal que o meu “work/life balance” – o Graal do homem pós-contemporâneo – pode ser melhorado com a ajuda da filosofia, dos amigos e da natação. Honestamente é bom mencionar que, em geral, essas discussões entre amigos são bem humoradas e descambam para a ironia…
No fim alguém sempre sugere que certo participante (aqui o “alvo preferido” varia entre os executivos do setor financeiro e os empreendedores mais bem sucedidos da turma) não precisaria mais trabalhar e poderia se dedicar simplesmente a filantropia, de preferência financiando as férias e/ou entretenimento dos amigos – o que não seria de todo ruim para a qualidade de vida geral, mas altamente improvável, dado que só tem mão de vaca na turma.
Mas, enfim… Houve uma vez, há mais de 3 anos atrás, que essa conversa foi especialmente importante para mim. Aconteceu cerca de uma semana antes do nascimento dos meus trigêmeos, um evento que iria obviamente alterar a minha maneira de ver o mundo. Não sei se por ansiedade ou simples medo causado pela aproximação da data provável de nascimento, eu me vi um pouco mais pensativo do que o normal. Primeiro fiquei vendo os e-mails voarem, sem comentar nada. Depois me lembrei do livro “O Mundo de Sofia” do Jostein Gaarder e dos programas do Alain de Bottom na BBC. Lembrei-me especialmente de que um grande diferenciador do humano é o fato de sabermos que nosso tempo de vida é limitado, ou seja: Relativamente cedo, adquirimos a consciência que iremos morrer. Esse conhecimento da própria finitude gera todo tipo de complicações, ansiedades, medos e desejos. Mas também pode gerar motivação, senso de urgência e a capacidade para grandes feitos e conquistas.
Com isso em mente, enquanto a discussão rolava, eu acabei me impingindo uma pergunta meio mórbida para alguns: “O que eu gostaria de estar fazendo quando o mundo deixasse de existir?“ – você pode interpretar isso como o fim do mundo ou como o fim da vida. Mas nesse exercício, achei importante não cogitar (ainda que crenças pessoais provavelmente influenciem o resultado) se há algo do “outro lado”…
Fig 2. Alguns PEBAS: Da esq. p/ dir. Abdo, Ruy, Aymar, Bonotti, eu, Barros, Tulio e Renato sentado na feijoada pós MMDB V (Guarujá, Nov, 2011)
Ou seja, a hora é agora, o lugar é aqui e esta seria a última chance de aproveitar algo. Cheguei à conclusão que gostaria de estar nadando no fatídico momento em que fossemos atingidos por um meteoro, que transformasse tudo na área do Brooklin/Morumbi em poeira cósmica. De preferência – e aí começo a elaborar isso mais como um “último pedido de condenado” – preferiria estar nadando com a galera amiga, ignorando completamente o perigo cósmico que se aproximava. Já que estou pedindo tudo isso, de preferência seria um treininho leve, sem técnico gritando na borda, numa água clara, com pouco cloro e temperatura em torno de 28º C. Como vocês podem concluir, eu gosto muito de nadar e acho que posso fazer isso no longo prazo, sem objetivos claros (em breve escreverei especificamente sobre isso). Sexo também seria uma boa última atividade, mas o risco de ser interrompido no meio do ato tira um pouco da graça da coisa… Já nadando, acho que dava até para se considerar sortudo, caso o mundo acabasse no meio de uma série de 8×200 livre p/ 3’, por exemplo. Claro que as opiniões podem divergir aqui…
Mas foi aí que (finalmente) me lembrei do Epicuro – o filósofo grego (na verdade ele nasceu na ilha de Samos que era uma cidade-estado, bem perto da Turquia) que viveu no século 4 a.C. Apesar de não ter sobrado quase nada dos escritos do cara, ele deixou muitos seguidores, uma escola de grande influência e uma doutrina filosófica bem difundida e interessante até os dias de hoje. Fazendo um curto resumo, Epicuro achava que o objetivo da filosofia era possibilitar uma vida tranquila e feliz. Para isso ele recomendava que nos ativéssemos a certas coisas básicas… A ideia é que podemos ser felizes com uma vida simples, autossuficiente e sempre cercado de amigos. E só. Ele considerava esses períodos de convivência entre amigos, no qual se analisava a própria vida, algo de grande importância. Por isso, a escola que ele criou era como uma comunidade ou república de amigos, que ele chamava de “O Jardim”. Onde entra a natação nisso? Bom, vamos lá:
E nessa toada, graças à natação, os bons amigos são os mesmos há mais de 20 anos. Lembro que em 2009, dentro da discussão “Epicurista”, alguém mandou um linkpara uma música do Oswaldo Montenegro que começa assim, meio como um desafio:
Fig 3. A equipe PEBA – Troféu de 3o lugar “equipes pequenas” na Copa Brasil de Masters em Ribeirão Preto (Agosto, 2011). Da esq. p/ dir: Tulio, Abdo, Renato, Bonotti, Minguez, Barros, Leonel, eu. Aymar (ECP) ajoelhado.
“Faça uma lista de grandes amigos
Quem você mais via há dez anos atrás
Quantos você ainda vê todo dia
Quantos você já não encontra mais ” (?)
Hoje acredito que o Epicuro e muito provavelmente o Oswaldo Montenegro, ficariam orgulhosos dessa nossa turma, que foi unida e se mantém unida em grande parte pela natação e pelo prazer de estar junto. Isso torna a vida melhor. Um abraços a todos!
R. Munhoz
Sensacional!!!! Muito bom Munhoz!!! E rumo à Ribeirão!!!!
A competição não é apenas um “pretexto”, é fundamental como incentivo a treinar. Poucos são os ex-nadadores que conseguem nadar “só por prazer” por muito tempo, tem que ter uma competiçãozinha para termos um mínimo de objetivos. Mas uma coisa eu concordo: alcançar o objetivo é o menos importante.
Valeu pelos comentários, Miyahara e Renato.
Sobre a importância dos objetivos e das competições, temos um debate antigo… Mas talvez a competição seja mesmo mais que um pretexto, pois o evento acaba alinhando os objetivos do grupo todo mais eficientemente – e fomos treinados para reagir positivamente a este tipo de estímulo. Acredito também que objetivos SMART (Specific, Measurable, Achievable, Realistic, Time-bound) sejam impotantes para qualquer negócio e podem ser um ótimo estímulo pessoal. Contudo (e aqui é apenas a minha opinião, claro) acho que nesta altura não vale tanto a pena colocar muita expectativa nos resultados. Pessoalmente, gosto de manter algum foco no processo (treino), aproveitando a jornada mais do que o destino final.
Abraços,
Munhoz.
Eu não nado nem nada, mas depois disso tudo vou gostar mais da natação e do epicuro 😉
Karin, nunca é tarde pra filosofia (especialmente de bar) ou pra nadar…
Boa Munhoz! Ainda não consegui a disciplina pra nadar com regularidade! Mistura de falta de tempo, uma boa pitada de preguiça e a vontade de sair do trabalho e ver a família! Estarei em RP e concordo com o R. Precisamos de um mínimo objetivo! Costas sempre foi meu pior estilo. Me inscrevi nos 50m costas. Quem sabe o objetivo não pinta nessa prova, praticamente sem comparativo com os dias de gloria de outrora!
Lelo, pra mim hoje em dia, disciplina é meio sobre encontrar um ritmo que acomode as atividades que considero importantes. Acho que é importante ter alguma flexibilidade e principalmente não se estressar quando as coisas não dão certo – senão enche o saco rapidinho. Tenho certeza que logo você vai estar detonando, porque talento você tem de sobra. Abraços!
Munhoz belo texto. Não nada mais com a frequência que gostaria por diversos motivos, mas encontrei na corrida os mesmos valores e motivações.
estamos juntos nos jardins de RP e da MMDB!
Abs
Abdo
Abdo, Como vc sabe, já tentei treinar corrida e cheguei a fazer uns triatlons, mas natação é o que mais gosto, não tem jeito… Mas a MMDB é sagrada e neste ano estarei lá sofrendo novamente, enquanto você disputa a liderança da prova com o Aymar, Guilherme ou aquele coroa do Guarujá!
Parabens… Texto magnífico, cativante e motivante!!
Um grande abraço a todos.
Glauco Casimiro
Só uma pergunta: -Quem é a “rosa” deste jardim ????
Grande Glauco! Valeu pelo comentário! Sobre sua pergunta: Tem uns caras na turma que ficam meio rosados quando tomam sol… será que…? xiii…
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