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Natação e cia.

O Complexo de Muttley

Quando eu era moleque, o que me atraia na natação eram as medalhas. Eu era maluco por elas. Não me interessava muito o título, desde que a medalha fosse bonita e quanto mais pesada melhor. E já que não tenho a mesma memória do Fernando Magalhães ou do Renato Cordani, que conseguem contar com detalhes cada Júlio Delamare, cada José Finkel ou Troféu Brasil que nadaram, achei interessante contar minha vida de nadador através das medalhas que ganhei e que tanto me fascinaram.

Medalha JudoCuriosamente minha primeira medalha veio do judô, quando eu tinha apenas 8 anos de idade: prata num campeonato regional. Foi minha primeira difícil decisão da vida. Quando no Infantil A comecei a nadar de madrugada na fria piscina do Pinheiros, carinhosamente apelidada de Sibéria, meus pais me botaram “na parede” e me fizeram escolher entre judô e natação. Escolhi a natação, mas com uma certa dor no coração.

Prepaulista

No Infantil A comecei a me destacar no nado peito e embora minha primeira premiação tenha sido um melão pelo 2º lugar no 50m peito no tradicional Torneio da Fruta do Pinheiros, perdendo o ouro pra um tal de Guto, minha primeira medalha importante veio em 1981 com o ouro no 100m peito no Campeonato Pré-Paulista, uma espécie de aquecimento para o Estadual, com equipes de São Paulo e cidades próximas. Fiquei desapontado com o tamanho da medalha (minúscula) e impressionado com um tal de Eugenio Leite, do Tênis Clube de Campinas, que ganhou todas as suas provas.

PaulistaO próximo passo era buscar o título estadual e ele veio em 1982, no revezamento 4x100m Medley, com direito a recorde paulista. A forte equipe era formada por Cassiano Leal, eu, José Carlos Souza Junior e Miguel Florestano e o recorde durou muitos anos. Achei estranho que a medalha não tinha corrente. Na minha cabeça medalha com corrente de metal parecia mais valiosa que as outras.

Chico PiscinaO título paulista me credenciou a nadar o Troféu Chico Piscina em Mococa e sua medalha foi o sonho de consumo da minha infância. Passei muito tempo sonhando em conquista-la e quando o fiz, passei o fim de semana com ela no bolso. Foi minha última medalha importante do Infantil A.

A puberdade demorou a vir e com isso conheci de perto o conceito PEBA de ser. O Infantil B foi um desastre, salvo em 1984 pelo bronze no 4x100m Medley no Campeonato Paulista de Verão, onde curiosamente fechei de crawl porque o Claudinei César Pereira, vulgo Traqueta, havia me batido no 100m peito. Melhorei 4 segundos e consegui segurar o Espéria de Marcelo Vitorino.   Estranhamente essa talvez tenha sido a medalha que mais me orgulhei na carreira. Cheguei a dormir com ela e só não tirei foto pois é o mesmo modelo do Paulista lá de cima.

PernambucanasAí veio o Juvenil A, com ele a puberdade e consequentemente o fim da época das vacas magras. Comecei a melhorar novamente e depois de presenciar o sensacional ouro do Marcelo Grangeiro no Troféu Júlio Delamare, passei a sonhar com esse título que na época parecia bastante improvável. Em 1985, com apenas 14 anos, nadei meu primeiro Finkel e Júlio Delamare e em 1986 meu primeiro Troféu Brasil. No ano seguinte fui campeão paulista de 1500m Livre e cheguei no Júlio Delamare de Porto Alegre com chances reais de medalha nessa prova e nos 400m Medley. Nessa última fui desclassificado nas eliminatórias por virada irregular no nado de peito (não consegui maiores explicações). Foi minha única desclassificação em prova individual na vida. Teria nadado a final A na raia 2. Já os 1500m não pude nadar graças a uma intoxicação alimentar que assolou toda a equipe do Paulistano e nos tirou da competição no último dia. Curiosamente eu também nadaria a final A na raia 2. A medalha do Júlio Delamare teria que ser adiada para o Juvenil B, embora como prêmio de consolação, eu tenha levado o ouro e a bonita medalha no Torneio Pernambucanas de Natação em 87.

IntercolonialMinha primeira medalha no Juvenil B foi curiosa e veio do Intercolonial, competição destinada a descendentes de japoneses. Não lembro porque fui convidado e como aceitaram minha inscrição, mas nadei e levei o metal.

 

 

image (6)

O sonhado ouro do Júlio Delamare só veio na temporada seguinte, em Janeiro de 1989, nos 200m peito, depois de ter conseguido a prata nos 400m Medley no dia anterior (oficialmente minha primeira medalha de JD). A sensação foi indescritível, até porque valeu minha primeira convocação para a Seleção Brasileira. Começava aqui a minha saga em busca da Tríplice Coroa (ouro individual no Júlio Delamare, José Finkel e Troféu Brasil).

 

sula rosarioTerminei a era Juvenil com a prata nos 200m peito no Sulamericano de Rosário, em 1989. Perdi pro Cacá (Carlos Araujo) que havia surpreendido a todos no Troféu Brasil dois meses antes com um excelente 2’26. Ele levou o ouro com o mesmo tempo. Eu nadei pra 2’27.

travessiaEm 1990 me aventurei em outros “ares” e levei minha primeira e única medalha de águas abertas, prata na tradicional prova da Baia de Santos. Foi a primeira vez que ganhei prêmio em dinheiro. Estava liderando e perdi o ouro nas últimas braçadas para o Amaury Alcântara, nativo de Santos.

claybomMeu primeiro recorde sulamericano veio em 1992 na prova do 4x50m Medley no Meeting Claybom de Natação em Guanabara. A competição colocava a Seleção Brasileira contra as Seleções Americana e Russa. Vencemos os russos na batida de mão e ficamos com a prata.

Trofeu BrasilEm 1994 finalmente o ouro no Troféu Brasil no 200m peito que me garantiu convocação para meu terceiro sulamericano. Faltava só o ouro do José Finkel para conquistar a Tríplice Coroa. Eu já tinha algumas pratas e bronzes, mas o ouro me eludia.

 

 

sula MaldonadoDois meses depois ganhei meu principal título: Campeão Sulamericano Absoluto no 50m peito. Eu obviamente não sabia, mas esse seria meu último Campeonato Sulamericano.

 

FinkelEm 1995 finalmente conquistei a Tríplice Coroa, com ouro no José Finkel, com direito a recorde brasileiro nos 200m peito com narração imperdível do Mário Xavier. Recorde esse batido somente em 1999. O ouro me garantiu a convocação para meu 2º Mundial de Piscina Curta e dessa vez com sabor especial, já que o Brasil seria a sede do campeonato.

PingoTodos os participantes do 2º Campeonato Mundial de Curta em Copacabana receberam a medalha comemorativa de participação. Medalha semelhante não foi oferecida no 1º Mundial, em Palma de Mallorca. De lá as recordações são apenas as fotos, os vídeos e a memória. O Mundial de Copacabana foi minha última competição de alto nível. Os anos de treinamentos fortíssimos já pesavam nos meus ombros e eu não conseguia mais me dedicar aos treinos como deveria.

Ainda levei a natação nas coxas em 1996 e nadei, sem pretensão alguma, as Eliminatórias paras as Olimpíadas de Atlanta, como também o José Finkel e Troféu Brasil. Foram meus últimos. Parei de nadar logo em seguida, depois de longas férias onde eu pretendia descansar por 3 meses e voltar com tudo. Essa volta nunca aconteceu e as férias de 3 meses viraram férias permanentes.

Tenho orgulho dos títulos, principalmente da Tríplice Coroa, um feito para poucos nadadores, mas prezo muito mais tudo que a natação me trouxe: as experiências vividas, a oportunidade de morar fora do país, as viagens, os amigos de infância que guardo até hoje e a certeza que fui bem longe pra quem tem sangue PEBA nas veias.

12 comentários em “O Complexo de Muttley

  1. LAM
    1 de setembro de 2014

    Para dar um incentivo extra pro meu professor da Cia Atlhética, que iniciou hoje sua participação no Finkel em Guará, levei minhas medalhas de TB e Finkel prá ele ver na semana passada… Qq PEBA consegue umas destas 😉 basta querer

    • rcordani
      2 de setembro de 2014

      Mas você levou só as individuais ou incluiu aqueles revezamentos que você foi carregado nas costas pelo Gustavo Borges, Michelena, Esmaga, JR?

      • Lelo Menezes
        2 de setembro de 2014

        Boa, e também não vale aquelas medalhas de Finkel na época da piscina longa, com água congelada em Curitiba. kkkkkk

      • LAM
        2 de setembro de 2014

        Hahahaha, como vc é trouxa… fui carregado pelo Olímpico Cassiano e pelo Hepta Campeão Master Cheiroso

  2. rcordani
    2 de setembro de 2014

    Boa Lelo, e acabou que ficou sendo um bom resumo da sua carreira, e pelo jeito a memória ainda está boa, melhor do que a do Munhoz, por exemplo!

    Medalha demais é exagero, mas as principais são tóis. Em casa fiz um quadro com as “10 mais”, e depois não resisti e fiz outro quadro com as “next 34 mais”.

    • Lelo Menezes
      2 de setembro de 2014

      Quadro de medalhas é obrigatório e eu me arrependo de ter arrancado as correntes da maiorias das medalhas que eu ganhei (exatamente pra caber no quadro). Alias, achei algumas medalhas do Torneio Osmir Nespatti no Paineiras. Ainda existe isso ai?

      • Fernando Cunha Magalhães
        6 de setembro de 2014

        Meu pai fazia quadros de medalhas muito caprichados para mim.
        O segundo que ele montou mede cerca 1,80m x 0,60m e tem um tecido marrom no fundo – fui dormir, ele estava começando. Trabalhou toda a madrugada e quando eu acordei estava pronto – lindo!
        Mas devo confessar que levei um choque quando vi que havia arrancado as correntes.
        Ele deu o argumento definitivo para justificar e espero não ter demonstrado o desapontamento na minha expressão – não seria justo diante daquela enorme dedicação para valorizar as conquistas do filho.

      • Rodrigo M. Munhoz
        7 de setembro de 2014

        Memória muito melhor que a minha com certeza! Meu quadro de medalhas tem algumas em comum com essas do Lelo, mas sendo um presente dos meus pais de uns 30 anos atrás e sem reforma, está em estado de petição de miséria… esse post me fez lembrar que preciso dar um tapa no mesmo.
        Abraços!

  3. felipecasas
    2 de setembro de 2014

    eu viajo mto nas historia de vcs, viajo de forma boa e positiva! parabens, mais uma vez, pelo blog!

    abração

  4. Fernando Cunha Magalhães
    6 de setembro de 2014

    Lelo,
    eu também era maluco por medalhas.

    Minha primeira também foi no judô. Bronze numa competição no antigo ginásio grande do Clube Curitibano.
    Acho que foram duas lutas. Uma derrota, uma vitória.
    Naquele dia meu irmão foi prata na categoria acima.
    Eu não tive que decidir, minha mãe decidiu por mim e adorei sair do judô – odiava caminhar agachado em volta do tatame – hoje acho um super esporte!

    Não tem uma foto com você no pódio com o melão?
    Achei sensacional. Meu amigo Rubens Tempski, judoca bronze no mundial universitário, certa vez começou a treinar sumô para melhorar a base. Nos torneios, chegou a ganhar um saco de 5kg de arroz como premiação.
    No Curitibano, logo que passei das categorias de base, começaram a fazer Torneios do Chocolate – achei ótima ideia – olhava os tempos fracos dos resultados e ficava sonhando com o chocolate perdido.
    Acho que o LAM que começou a nadar mais tarde, chegou a participar de um desses aí.

    Timaço esse da 1a conquista estadual. E lógico… medalha com corrente era outra história. Muito mais legal.

    Desde que ano existe o Chico Piscina? Quando eu tomei conhecimento da existência desse torneio, já havia passado a idade de participar. E logo as equipes paranaenses começaram a ir e há anos já transmitem ao vivo no SporTV.

    Que farsa essa participação no Intercolonial… os nisseis não te olhavam com indignação, especialmente após a conquista do metal?

    Também só medalhei no JD no Juvenil B. Meu 1o ouro também foi minha segunda medalha e também no dia seguinte da prata. E também estreei no Sulamericano com prata – levei pau do Castor nos 200m livre.

    A competição em que você conquistou a TRÍPLICE COROA foi minha última competição oficial.

    Muito bacana seu relato. Uma carreira brilhante.
    Parabéns e forte abraço!

    • Lelo Menezes
      9 de setembro de 2014

      Valeu Esmaga! Muito bacana ver que nossas carreiras tiveram tantas similaridades! Eu preciso procurar se tenho fotos do Torneio da Fruta. Um fato interessante e engraçado é que o vencedor ganhava uma melancia e eu acabei quebrando a melancia do Junior (José Carlos Souza Jr) e tomei um pito da mãe dele. kkkkk!

      Quanto ao Chico Piscina, ele iniciou-se em 1968, de acordo com o site oficial do Torneio, e está indo para a 45a edição.

      Sobre o Intercolonial, eu me recordo que haviam outros “não-nipônicos” nadando. Me lembro nitidamente de ter curtido a medalha do Alexandre Wasong, antes de ter ganho a minha. Acho que foi uma edição que liberaram convites para não-orientais, mas não tenho certeza.

      abs

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Publicado em 1 de setembro de 2014 por em Natação.
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