EPICHURUS

Natação e cia.

A Historia da Carochinha Virou Pesadelo!

A menina nasceu em 1969 e ainda criança aprendeu a nadar. Foi um salva-vidas, no entanto, que viu talento na guria e recomendou que ela fosse treinar com a equipe infantil do clube.  Com 9 anos competiu pela primeira vez, com 14 foi campeã nacional e nessa idade já era reconhecida como a maior promessa da natação feminina do país.   O sonho olímpico nasceu, embora tímido.  Ser campeã nacional em um país sem nenhuma tradição internacional era uma coisa, sonhar com medalha olímpica era outra bem diferente.

Passados quatro anos do primeiro título nacional, a menina realizou seu sonho.  Foi convocada, com apenas 18 anos, para sua primeira Olimpíada.  Ela queria ficar entre as 16 na sua prova principal, mas só a experiência de participar dos jogos já valeria a pena, afinal era ainda jovem e estreante na maior competição do planeta.  Infelizmente o peso da estreia foi muito grande pra ela. A garota amargou a 25º colocação.

A menina voltou para casa e durante os próximos quatro anos treinou com todo afinco do mundo.  Chegou a mais uma Olimpíada.  Dessa vez, com 22 anos, estava no auge da carreira.  o sonho de ficar entre as 16 continuava forte e diferente de quatro anos atrás, ela estava muito confiante.  Só que muitas vezes nossos sonhos não se tornam realidade.  A menina não nadou como queria e novamente, na sua principal prova, ficou aquém do que sonhava terminando em 26º.  Depois de duas medíocres participações a menina devia ter assumido sua condição semi-PEBA, mas ela se recusou a desistir.

Por mais quatro anos a menina treinou e aos 26 anos de idade foi pra sua terceira Olimpíada.  Só que dessa vez ela não queria mais ser uma mera coadjuvante, nem mesmo queria ficar entre as 16.  Seus resultados do ano anterior, quando ela deu um salto inacreditável de qualidade, lhe credenciavam ao ouro olímpico.  E assim, como num passe de mágica, a menina saiu das olimpíadas com três ouros e um bronze, todas em provas individuais.  Um verdadeiro milagre ou para quem preferir a prova viva de que “basta acreditar” para alcançar os mais improváveis resultados.

A emoção do ouro olímpico

A emoção do ouro olímpico

A historia que eu contei acima parece da carochinha, mas aconteceu de verdade.  A irlandesa Michelle Smith, depois de amargar, na sua principal prova, os 400m Medley, o 25º lugar em Seul e 26º em Barcelona, saiu de Atlanta com ouro nos 400m Medley, 200m Medley e 400m Livre e ainda um bronze nos 200m Borboleta.

A historia parece um sonho maravilhoso, mas não é tao bela como parece.  O que eu não mencionei acima foi que nos jogos de Barcelona Michelle conheceu seu futuro marido, o holandês Erik de Bruin, atleta de arremesso de disco, que encerraria sua carreira por causa de doping.  Ele passou a ser o técnico dela e Smith se mudou para a Holanda para treinar sob a tutela do maridão.

As 4 medalhas olímpicas

As 4 medalhas olímpicas

Michelle Smith, como manda o figurino, passou incólume pelo exame anti-doping em Atlanta, mas foi forçada a se aposentar pouco mais de um ano depois, após ter a substância Androstenedione, um anabolizante precursor da testosterona, encontrado em sua urina em exame surpresa.  Durante a investigação duas amostras dela de 1997 foram testadas para a mesma substância e ambas retornaram positivas.  A suspensão de 4 anos foi suficiente para ela pendurar o maiô.

Tudo que esta escrito acima é fato!  Todos têm o direito de acreditar ou não se ela nadou dopada em 1996.  Ela até hoje alega inocência e insiste que nadou completamente limpa, mas na minha opinião não existe nenhuma chance dela ter tido essa melhora toda, aos 26 anos de idade, sem ajuda do doping e por isso fico tranquilo em escrever os parágrafos abaixo e ressalto que Michelle é motivo de vergonha para o povo irlandês, com dezenas de artigos escritos por jornalistas esportivos locais no final da decada de 90 criticando-a duramente em títulos como “Dismantling an Irish Legend” e “Michelle Smith Should Be Airbrushed From Irish History”.

Smith e o marido ao fundo, no tribunal em 1998, se defendendo das acusações de doping.

Smith e o marido ao fundo, no tribunal em 1998, se defendendo das acusações de doping.

Eu acho o caso da Michelle muito triste porque demonstra claramente o poder impressionante do doping.  Uma atleta semi-PEBA se transforma em tri-campeã olímpica, quase que da noite pro dia.  Mais que isso, o caso reforça a triste teoria que o exame anti-doping esta sempre um passo atrás do doping e que casos como o dela não devem ser isolados ou tão raros assim.  Infelizmente a maioria passará pra sempre despercebido.

Agora imaginem a frustração de Dagmar Hase, Marianne Limpert e Allison Wagner, prata nos 400m Livre, 200m e 400m Medley respectivamente, que devem viver suas vidas com a fortíssima convicção que tiveram seus ouros olímpicos “roubados” por Smith.  Imaginem também quem ficou em 4º ou 9º.  Deve ser caso de psicologo para uma vida toda!

19 comentários em “A Historia da Carochinha Virou Pesadelo!

  1. rcordani
    9 de novembro de 2015

    Boa Lelo. Eu sou absolutamente contrário a que se atribuam bons resultados ao doping apenas, mas quando a pessoa é pega no antidoping vale contestar tudo, até o que fez antes.

    Você sabe se entre Barcelona e Atlanta ela tinha melhorado de nível em mundiais e etc ou tudo apareceu apenas em Atlanta?

    O que impressiona nessa história é que praticamente podemos MEDIR a diferença que o doping faz, algo como CINCO SEGUNDOS A CADA 100m! (melhorou 10s em 200M e 19s em 400M).

    • Lelo Menezes
      9 de novembro de 2015

      Pelo que me consta a melhora significativa se deu em 1995, no Campeonato Europeu, onde ela foi campeã e passou a ranquear entre as melhores do mundo…

  2. Patricia Angelica
    9 de novembro de 2015

    História didática de como o doping provoca um “fascínio” (tanto positivo como negativo). Afinal, que atleta não sonha com uma melhora fantástica dessas, né? E quem não fica revoltado ao descobrir que algumas maravilhas que vemos em piscinas, pistas, quadras e campos são frutos de desonestidade? =/

    • Lelo Menezes
      9 de novembro de 2015

      O doping é a coisa mais nefasta do esporte Patricia! Eu nem consigo imaginar como eu me sentiria se eu perdesse um ouro olímpico pra um dopado! Deve ser um sentimento terrível!

  3. Luiz Alfredo Mäder
    9 de novembro de 2015

    acho que até podemos separar os casos de doping em dois tipos diversos, até os 15-16 anos por influência de técnicos mal-intencionados e em nadadores adultos, estes totalmente responsáveis por seus atos.

    • Lelo Menezes
      9 de novembro de 2015

      Eu não acho que deva ter tantas casos assim entre os 15-16, talvez na China onde o atleta deve ser obrigado a se submeter as políticas do governo (licitas ou ilícitas). Adulto se dopando é pra ser banido, na 1a instância e ponto final.

  4. felipecasas
    9 de novembro de 2015

    esses dias passou no sportv3 o filme das olimpiadas de atlanta. no proprio filme menciona as melhoras dela, coisa de, nao lembro exatamente, mais de 15 segundos em relação aos melhores tempos da vida dela. dificil acreditar em algum treino/metodo/estilo de vida, que consiga esse progresso de forma limpa!

    Abraços

    • Lelo Menezes
      9 de novembro de 2015

      O progresso é surreal Felipe. Ouso dizer que o mais agressivo da história! Com 26 anos de idade, ainda mais na década de 90, antes do surgimento dos suplementos, uma menina era considerada velha pra natação. Manter seus melhores tempos já seria louvável. Melhorar o que ela melhorou beira o impossível!

  5. laurivalshita
    9 de novembro de 2015

    Quando comecei a ler este email achei que iríamos falar sobre a nossa Rebeca Gusmão, adoraria ver um artigo dela contando a sua história.

    A questão do doping é muito mais profunda do que atletas mal intencionados, segue artigo do WSJ sobre a ultima descoberta do mundo do atletismo.

    http://www.wsj.com/articles/former-iaaf-president-investigated-in-russian-doping-bribery-probe-1446668895

    • Lelo Menezes
      11 de novembro de 2015

      Esse negócio da Russia é o fim do mundo. Entendi que o problema está concentrado no Atletismo, mas a punição do COI precisa ser severa, a começar com a suspensão da Rússia para os jogos do Rio.

      • laurivalshita
        23 de novembro de 2015

        Para mim o caso expões o fato que em relação ao doping não podemos confiar nem nos organismos oficiais como a IAAF.

        Não é a toa que o esporte competitivo é hoje praticado embaixo de uma nuvem de desconfianças.

  6. Andreghetto
    9 de novembro de 2015

    quantos casos passam mas que valor tem esta medalha? fora conquistada na trapaça, não é para isso que o esporte saudável surgiu.

    • Lelo Menezes
      9 de novembro de 2015

      A medalha tem valor ZERO, mas o estrago que isso causa no esporte é imensurável. Pegamos apenas os 400m Medley como exemplo e a Smith ferrou quem foi prata, quem foi bronze, quem foi 4o lugar, quem foi 9o lugar e quem foi 17o lugar. Essas atletas foram terrivelmente afetadas.

  7. Rodrigo M. Munhoz
    9 de novembro de 2015

    Lelo, esse foi sem dúvida um triste caso de “melhoria difícil de engolir”… não apenas pela queda brusca dos tempos da nadadora, mas também pelo alto perfil (ouros olímpicos!) e pelo envolvimento do marido dopado na história. Ninguém é ingênuo ao ponto de não suspeitar. Contudo deve ser dito que ela é campeã olímpica de acordo com os livros de história, já que nada foi provado contra ela sobre a ocasião da Olimpíada de Atlanta – na qual foi uma estrela.
    Mas porque não testaram as amostras de 96? Ou testaram as mesmas e deram negativo? Quantos falsos negativos passaram desapercebidos? A quem interessou a manutenção da história?
    Com todas essas dúvidas pairando no ar, só o prejudicado principal me fica claro no fim: O esporte olímpico como um todo.

    • Lelo Menezes
      9 de novembro de 2015

      Munhoz, nada foi provado em 1996, mas deixo você com um texto sobre o nível da moça.

      Using a “method to provide false urine samples” is nothing new in the crazy world of drug testing. The most celebrated case came in 1998 during a routine out-of-competition test with Irish swimmer Michelle Smith de Bruin. The triple gold medalist from the ’96 Olympics was walking toward her Lexus early one January morning at her ivy-covered home in County Kilkenny when the testing officers showed up.

      De Bruin, long suspected of doping given her pedestrian pre-Atlanta pedigree, disappeared inside for a few minutes and then let in the testers. She provided a urine sample only for the lab to discover it was untestable. The sample contained so much whiskey that, if it indeed came from her body, she’d be dead.

      De Bruin ultimately lost an appeal with the international Court of Arbitration for Sport and was banned. The prevailing theory on how the whiskey got in her urine sample: She inserted a whiskey-filled condom in a body cavity and pricked it with a fingernail.

      • Rodrigo M. Munhoz
        9 de novembro de 2015

        Uau… Que f… Deveriam ter sido mais cuidadosos ao testa-la em Atlanta, hein?!

      • Luiz Alfredo Mäder
        11 de novembro de 2015

        very nice story…

      • Fernando Cunha Magalhães
        17 de novembro de 2015

        Como diria minha sábia mãe: “tenho visto (ouvido, lido) coisas e presenciado fatos que me deixam estarrecido”

  8. Fabio Massuia
    12 de novembro de 2015

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Publicado em 9 de novembro de 2015 por em Natação.
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