EPICHURUS

Natação e cia.

Cadê nosso Hall of Fame?

No começo da década de 90 fui nadar um NCAA em Ohio. Chegamos com cinco dias de antecedência pra se aclimatar a piscina. Estava muito frio! Nevava inclusive. Os primeiros dois dias, até por conta desse frio, foram meio chatos. Hotel – piscina. Piscina – hotel! No final do segundo dia, tomamos uma baita bronca do Maglischo (técnico), que descobriu que a maioria da equipe ficava horas após o jantar jogando e competindo entre si em uma máquina arcade de basquete que estava disponível no salão de jogos do hotel. Basicamente você tinha três bolas de basquete que apareciam simultaneamente e você tinha 60 segundos pra arremessá-las, quantas vezes fossem possíveis, numa cesta que se movimentava eletricamente da esquerda pra direita e vice-versa. A bronca foi merecida! Um absurdo a ideia de ficarmos arremessando bolas de basquete (que não são nada leves) três dias antes da competição mais importante do ano. Enfim, juventude, espirito competitivo e a energia quase infinita que um nadador tem durante o polimento nem sempre andam de mãos dadas com o bom senso.

No dia seguinte acordamos cedo, tomamos o café da manhã e fomos para a piscina. Aquecemos e logo em seguida o Maglischo ainda deu uma palestra motivacional pra gente. Saímos do complexo aquático direto para o almoço e a expectativa era de retornar ao hotel e tirar aquela sensacional soneca da tarde. Entramos no ônibus de barriga cheia e o Maglischo anunciou a surpresa. “Vamos a Canton visitar o Hall of Fame de Futebol Americano”! Em meio a gritos emocionados, minha primeira impressão foi “Que saco”!

A visita ao HoF foi mais interessante do que eu imaginava, mas o que me chamou mesmo a atenção não foram os bonecos de cera de vários ex-jogadores e suas estatísticas, mas sim a emoção da grande maioria dos meus amigos nadadores. Inclusive fizemos um pit stop não programado no Hotel para que todos pegassem suas câmeras. O pedido foi praticamente unanime. Ficamos umas duas horas lá dentro, a galera tirou fotos com a estátua de seus ídolos e por ser estrangeiro, acabei tendo que ouvir quinhentas histórias de fulano e beltrano que dominaram o ataque ou a defesa em décadas passadas. As histórias eram bem emotivas, o que conflita inclusive com a própria natureza americana. Ouvi várias da infância distante onde relembravam jogos épicos ao lado do pai ou do avô. Até hoje não sei se a visita estava programada desde o inicio, ou se a bronca do jogo de basquete fez o Maglischo perceber que precisávamos nos distrair um pouco fora da rotina do NCAA, mas o importante é que sai de Canton com o senso que os americanos valorizam muito seus ídolos do esporte.

Arthur Albiero, eu e Jose Rodrigo Messias no Football Hall of Fame em Canton, Ohio.

Aqui no lado sul da América, O Milton Neves tem um programa onde ele conta o paradeiro de ex-jogadores de futebol. A grande maioria vive vidas simples em lugares remotos do Brasil ou do mundo. O meu ponto não é o programa em si, mas como o brasileiro tende a esquecer seus ídolos de outrora. A maioria dos jogadores mencionados no programa são totalmente desconhecidos para as gerações atuais. Eu dou a mão à palmatória também. Nadei peito a vida inteira e se eu disser que conheço somente uns 2-3 nomes de campeões desse estilo nos Troféus Brasil da década de 80 (década anterior a minha), eu não estaria exagerando. Antes disso então somente o Fiolo, que foi recordista mundial. A reciproca deve ser a mesma nessa geração do século XXI. Duvido que a grande maioria saiba nossos nomes e o que conquistamos! Devem lembrar do Xuxa, do Gustavo e do Romero. O resto deve ter caído no esquecimento.

Fiz um estudo rápido e não achei nenhum Hall of Fame em território brasileiro. Existem somente na esfera do clube. No estado de São Paulo, o Corinthians parece ter um, o Paulistano ouvi dizer que tem outro. Imagino que outros clubes também seguem o exemplo. Só que Hall of Fame oficial de um esporte aparentemente não temos nenhum. Nem mesmo o futebol, esporte mais popular do mundo e que leva multidões ao delírio em solo nacional tem o seu (embora o museu do futebol do Pacaembu se assemelhe a um). Infelizmente nossos principais atletas acabam ingressando nos Halls of Fames Internacionais sediados em outros países. Gustavo e Mauricio, na natação e vôlei respectivamente, são dois exemplos recentes. Ambos homenageados nos Estados Unidos. Guga nomeado esse ano e Oscar Schmidt em 2010 são outros dois exemplos.

Não quero entrar no mérito dos requisitos necessários para que um nadador ingresse num possível Hall of Fame da natação brasileira, nem mesmo quem julgaria esses méritos. Isso fica pra outra conversa! Mas eu adoraria levar meu filho para visitá-lo um dia. Acho inclusive que se bem implantado e bem gerido, um Hall of Fame nacional seria um enorme motivador para futuras gerações de atletas e seria uma boa adição a programas de incentivo aos esportes de base, como a introdução do esporte competitivo nas escolas por exemplo. É só olhar a influencia positiva que uma pequena visita do Phelps teve na criançada da Comunidade do Alemão no Rio de Janeiro. Os garotos ficaram claramente emocionados e em entrevistas vários prometeram se dedicar a natação. Quem sabe dizer a influência positiva que uma visita periódica ao Hall of Fame da Natação Brasileira não pode ter em outras milhares de crianças de comunidades carentes por esse Brasil a fora? Se o problema for verba, que tal um Hall of Fame Virtual (ideia do Rodrigo Munhoz que eu particularmente achei bem interessante). Não terá o mesmo impacto do que um construído no mundo real, mas já é um primeiro passo para o reconhecimento dos nossos principais talentos. Se tiver critérios claros de nomeação, e com o aval da CBDA, acho que seria um sucesso!

Não sei dizer se já houve alguma discussão lá dentro sobre qualquer implantação de um Hall of Fame de Esportes Aquáticos. Chutaria que não. Existem outras prioridades na CBDA! Mas como já disse anteriormente, gostaria muito de um dia poder visitar um Hall of Fame de Natação que conte a historia da natação brasileira e quem sabe um de futebol também não seria nada mal. Dado que os 200m peito são a prova nobre do nosso esporte, não seria impensável que um ou outro escritor do Epichurus consiga uma plaquinha pequenina colada perto da saída de emergência!  Quem sabe um dia!

17 comentários em “Cadê nosso Hall of Fame?

  1. rmmunhoz
    1 de novembro de 2012

    Realmente,sou testemunha que uma rápida o Museu do Futebol do Pacaembú faz qualquer um gostar mais do esporte bretão… Seria muito legal ter a memória do nosso esporte exposta de uma maneira bacana, ainda que outras prioridades provavelmente tenham mais urgência. Imagino gravações de narrações do Mario Xavier… Fotos do passado… Medalhistas de outras épocas… um prato cheio pra quem gosta de história! O Renato fez uma ótima pesquisa inicial dos grandes da nossa natação no início do Epichurus… pode ser um começo… Abraços!

    • Lelo Menezes
      1 de novembro de 2012

      Boa Munhoz! O estudo do Renato virou inclusive referencia de pesquisa pelo número de visitas ao texto dele. Só que ele só trata do olimpo, ou seja, medalhístas olímpicos. Precisamos de um estudo mais próximo dos mortais. Um estudo listando todos os campeões do Troféu Brasil/Maria Lenk já seria interessante! Acho que ninguém nunca faz algo parecido. Quanto ao Museu do Futebol no Pacaembu, uma visita é obrigatória! O lugar é de 1º mundo!

  2. LAM
    2 de novembro de 2012

    Esta semana assinei uma petição pública da Tia Gi para IMPEDIR a demolição do PA JDelamare.
    Se o texto do R. foi um passo para estudar a história da natação brasileira, a demolição será um passo na direção oposta.

    • Lelo Menezes
      4 de novembro de 2012

      É lastimável a demolição do Júlio Delamare, LAM! Muito provavelmente a piscina com mais história no Brasil! Sem duvida um passo na contra-mao!

  3. roseli de souza
    2 de novembro de 2012

    Acredito na história. Contada de forma clara e real de crescimento e enobrecimento. Suas experiências são diferentes da realidade brasileira. O esporte aquático não tem história e sim atleta vencedor que virou história dentro da modalidade. Proponho com sua experiência, cultura, conhecimento juntar-se à nova proposta de modificação de composição de chapa de eleição da CBDA e começar à formar valores do esporte aquático no nosso país. O que temos hoje é um esporte com estrelas solitárias que chegaram lá por méritos próprios,sózinhos e depois da “fama” foram aclamados como esporte nacional. Ainda temos muito que aprender para ter o nosso Hall da Fama.

    • Lelo Menezes
      4 de novembro de 2012

      Obrigado pelo comentário Roseli. Não acho que o esporte aquático não tem história. Não temos uma rica história olímpica. Aí sim temos estrelas solitárias, mas nossa história nacional é rica, só precisamos resgata-lá! Alias, uma das finalidades desse nosso pequeno blog é trazer de volta algumas delas. Infelizmente ficaremos restritos ao final dos anos 80, inicio da década de 90 quando estávamos na ativa. Precisamos de historias de todas as épocas, principalmente antes da década de 80, onde praticamente não temos nada escrito por aí na Net!

      Abraços

  4. Anônimo
    2 de novembro de 2012

    Pelo não temos nem piscinas publicas decente, cada piscina é de um jeito. Mas penso que daqui uns 100 anos pode acontecer.

    • Lelo Menezes
      5 de novembro de 2012

      Pois é anônimo! Existem prioridades mais importantes sem duvida, a principal é mostrar “serviço” em 2016. No entanto as coisas podem ser tocadas em paralelo. Uma prioridade nao precisa ser pré-requisito pra outra!

      Abraços

  5. rcordani
    4 de novembro de 2012

    Ótimo post Lelo. Realmente precisamos de um Hall of Fame. Podíamos começar com os atletas que constam daquele texto inicial (Um Resumo da História da Nata’ão Brasileira – aqui no Blog) e depois ir ampliando.

    Uma coisa que eu não sei: há um arquivo com todos os resultados dos campeonatos brasileiros, por exemplo? Eu até me interessaria por ajudar a digitalizar todo esse conteúdo. Sei que a partir de um certo ano a Swimitup tem, correto? Qual é esse ano? E antes, alguém sabe onde podemos achar resultados? (OBS – a pergunta não é obviamente para o Lelo, mas para a comunidade aquática que nos visita).

    • Lelo Menezes
      4 de novembro de 2012

      Valeu Renato! Acho que esse arquivo não existe de forma consolidada. Sei que a Swimitup tem resultados de Maria Lenks/Troféus Brasil/Júlio Delamares passados mas acho que nem chegam na década de 90. Seria muito bacana levantar essas informações!

    • Amendoim
      5 de novembro de 2012

      Quem deveria ter esse resultados é a CBDA, mas acho difícil, no site vc encontrará todos os resultados de 2001 prá cá. Talvez o Ricardo de Moura possa indicar alguém para ajudar nessa busca.
      Alguns anos atrás o ex diretor técnico da FAP (antiga FPN), Ismar Barbosa me disse que estaria fazendo um levantamento desse de Campeonatos Paulista.

      • Lelo Menezes
        5 de novembro de 2012

        Olhei no site da CBDA e os links vão até 2001, mas alguns deles não funcionam! Procurei bastante hoje sobre resultados de TB e JF da década de 90 e não achei nada!

  6. Amendoim
    5 de novembro de 2012

    Na quarta começa o Troféu Open de Natação, darei uma perguntada para os técnicos se alguém pode ajudar nessa questão.

  7. ruy araujo
    13 de novembro de 2012

    Muito legal o post Lelo. Fui para Miami no inicio do ano e fiz questao de conhecer o Hall of fame em Ft Laudardale, ate porque o Gustavo Borges havia sido indicado recentemente. Achei legal, alem do fato de preservar a memoria da natacao mundial, contar um pouco a historia da evolucao do esporte com quadros e gravuras de proto-piscinas. Inclusive ja era peca de museu o famoso palmar de forma retangular da Speedo que tanto usei e deve ter estourado o ombro de diversos nadadores. No dia que fui estava muito calor (ah va!!!) e, no mesmo complexo tinha uma piscina olimpica (ou semi) com aquela agua azulzinha que instiga o instinto de qualquer ex-nadador de querer cair na agua e voltar a nadar novamente. Sai de la comprando 1 oclinhos e 1 camiseta que estao sendo usados atualmente. Quando visto a camiseta, praticamente volto no tempo e tenho a mesma sensacao de quando usava (de forma parcimoniosa) a camiseta “Love a swimmer today”.

    • Lelo Menezes
      14 de novembro de 2012

      Boa Ruy! Eu visitei o HoF de Fort Lauderdale em 1986 enquanto participava de um Swim Camp do Bob Steele. Nunca esqueci a visita!

  8. Pingback: Hall da Fama da Natação Brasileira saindo do forno!!! | Epichurus

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Publicado às 1 de novembro de 2012 por em Natação e marcado .
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