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Natação e cia.

Thomas Fahrner e a cahgada do século.

(Minhas sinceras desculpas pela palavra de baixo calão no título, eu juro que troco se alguém sugerir uma melhor, desde que exprima todo o conteúdo da cahgada efetuada)

Essa história é do tempo em que não havia semifinal olímpica, mas havia a fatídica Final B.  Nadavam todos de manhã, e do primeiro a oitavo classificavam-se para a Final A (que valia medalha) e do nono ao décimo sexto amargavam a Final B (também chamada de “Série de Consolação”, e isso não é uma ironia). O ganhador dessa porcaria série B ficava em nono lugar.

E já aconteceu com quase todos nós: o sujeito nada mal de manhã, e não pega final. De tarde se sente bem melhor e na final B faz um tempo que teria sido suficiente para se classificar de manhã, e dá uma raiva danada. Já é um pouco mais raro, mas também já aconteceu um par de vezes: o sujeito vai mal de manhã, e com o tempo que fez de tarde na Final B teria pego medalha! Nunca aconteceu comigo, mas imagino que deve deixar um gosto bem amargo na boca!

Mas desventura pior do que a ocorrida com Thomas Fahrner nas olimpíadas de Los Angeles 1984 é difícil de imaginar.

Sendo um dos favoritos nos 400m Livre, o alemão Thomas Farhner não queria nadar a final nas raias centrais, preferindo comer pelas beiradas. Nadou na terceira das cinco séries e, segundo suas próprias palavras (veja na matéria abaixo): “eu devia ter nadado mais forte de manhã ao invés de ter pegado tão leve”. Pois então, ganhou a terceira série, mas ficou em nono no geral e obteve a raia 4 da Final B. Apenas dezenove centésimos o separaram da Final A.

Em Los Angeles – 1984 a programação das finais ocorria na seguinte ordem: a série A nadava, depois vinha a premiação e só depois nadava-se a consolação. O americano George Di Carlo ganhou o ouro olímpico com 3:51.23 (recorde olímpico), recebeu a medalha, e ouviu o hino dos EUA. Menos de dez minutos depois, na série B, Thomas Fahrner ganhou a série, bateu o recorde olímpico (3:50.91) e ficou com o NONO LUGAR. Imagine como deve ter ficado a cara dele quando percebeu que poderia ter levado o ouro!

Quer dizer, imagine não, VEJA a cara dele clicando no filminho que editei (abaixo).

Mas não chorem por Fahrner o mesmo tanto que choraram por Moffet. Por justiça, o ouro olímpico dos 400m Livre de 1984 deveria ter ficado com o então imbatível Vladimir Salnikov, que detinha o recorde mundial (3:48.32) mas não pode participar dos jogos por causa do boicote soviético. E em 1984, apesar da incrível bobeada, Fahrner não ficou com as mãos abanando: levou o bronze nos 200m Livre e a prata nos 4x200m Livre (além do bronze dos 4×200 de Seul – 1988) ou seja, ao contrário de Moffet, o quadro de medalhas olímpicas de Fahrner não está vazio.

A reportagem do Los Angeles Times cobriu o fato.

Quanto à Di Carlo, quando perguntado se teria ganho de Fahrner caso este estivesse na final, saiu-se com essa: “Acho que sim…com certeza! Por que não dizer isso? Eu nunca mais vou nadar essa prova na minha vida!

E o ouro olímpico está em sua parede.

Sobre rcordani

Palmeirense, geofísico, ex diretor da CBDA e nadador peba.

41 comentários em “Thomas Fahrner e a cahgada do século.

  1. Rodrigo Munhoz
    26 de agosto de 2013

    Caracas, Renato… legal você lembrar do cara da final B :-). E esse é o risco (e exemplo supremo de fail) de querer “comer pelas beiradas”…nos dias de hoje, com semi-finais no meio, é ainda mais complicado. Mas fiquei feliz em saber que o cara não se matou nem nada e ainda pegou uns metais nos Jogos posteriores. Uma história triste e engraçada ao mesmo tempo. Incrível como Los Angeles deixou grandes histórias dramáticas, apesar da ausência da URSS.
    Espero que o Rio tenha uma dose semelhante de lembranças a serem criadas!

    Abraços!

    • rcordani
      26 de agosto de 2013

      Acho que toda olimpíada tem casos interessantes. Mas essa de recorde na final B creio ser o único!

  2. Sidney N
    26 de agosto de 2013

    Impressionante! Acho que não tem expressão melhor mesmo para o feito. É muito pior do que pegar 9o em semi-final tentando se poupar porque nesse caso a contra-prova é concreta e não especulativa.

    • rcordani
      26 de agosto de 2013

      Bom, em 400L não tem semifinal, realmente seria melhor para o TF ficar sem essa! Menos mal que ele tem três metais em casa, porém nenhum dourado. Quando alguém pergunta sobre a carreira olímpica dele, será que ele conta essa história? Será que a moçada aponta e diz “tá vendo aquele ali, então, era nadador, mas bateu o recorde na final B e ficou sem medalha…”

  3. Fábio Yamada
    26 de agosto de 2013

    O artigo não teria o mesmo valor sem o título. Pobre alemão… Na minha realidade PEBA, passei por duas parecidas.

    No meu último ano de Infantil B, fui nadar um Brasileiro de Inverno no finado Guanabara. Era a primeira vez que tinha chance de medalha em brasileiros. Ou seja, estava (bem) nervoso. Nadei minha primeira eliminatória, dos 200 medley, na raia 4 da última séria da eliminatória. Tinha feito 2’20 no paulista de inverno na curta e nadei para 2’25 na eliminatória na longa, relativamente tranquilo. MAS senti que tinha errado minha virada do peito para o livre (!!!!). Depois da chegada, vi o árbitro da minha raia se dirigindo à cabine de controle. Não deu outra. Fui desclassificado. À tarde, o Henrique Niekawa ganhou a final com 2’26. Se eu ia ganhar a prova ou não à tarde são outros 500, mas foi de cahgar (para ficar na temática do artigo…)

    Alguns anos depois, em 89, fui nadar uma eliminatória de 200 livre em um Paulista de Verão na saudosa Marília. De novo raia 4, segunda e última série. Me lembro até hoje que o Piu (Ricardo Esteves) estava na 5. “Controlamos” a série, cheguei um pouco à frente dele. Resultado: fui primeiro reserva, o Piu segundo e a primeira série inteira nadou a final! hahahahaha Juro que estou rindo sozinho agora só de lembrar.

    Abraço,

    Fábio Yamada

    • Oscar Godoi
      26 de agosto de 2013

      Muito boas lembrancas melhor que essa foi o 200 costas em um paulista de santos onde o Piu-Piu bateo a mao comemorou ate com socos e gritos, sem se dar contas que na raia 1 estava nosso amigo Boraskique acabava de quebrar o rcorde de campeonato, ate o Xavier ficou meio com vergonha na hora de pre anunciar. Estava no pinheiros na epoca e estavamos todos sem meio que sem saber o que fazer. grande abraco.

      • rcordani
        26 de agosto de 2013

        Oscar acho que eu me lembro dessa, foi em Marília, né?

      • Fábio Yamada
        27 de agosto de 2013

        Bem lembrado, Oscar. Foi em um Paulista de Inverno, no Inter, em Santos, em 1990.

    • Fernando Cunha Magalhães
      26 de agosto de 2013

      Yamada, que vacilo! Vc iria ganhar o brasileiro com quase 10m de vantagem.

      • Fábio Yamada
        27 de agosto de 2013

        hahaha, também não era para tanto, Esmaga! abs.

      • Fernando Cunha Magalhães
        27 de agosto de 2013

        Como não?
        Niekawa ganhou com 2m25s e vc tinha 2m20s. É só fazer a conta.

    • rcordani
      26 de agosto de 2013

      Haha Fabio, bobagem em paulista vá lá, mas em brasileiro dói, né? Mas desclassificação pelo juiz é bem diferente, eu mesmo fui desclassificado umas dez vezes, um dia quem sabe eu conto aqui…

      • Fábio Yamada
        27 de agosto de 2013

        Acho que fugi do tema, Cordani. Foquei na cahgada! abs

      • rcordani
        27 de agosto de 2013

        🙂

    • Hiran Carlos Gallo
      26 de agosto de 2013

      No mesmo ano Yamada, tivemos o brasileiro de final de ano no Julio de Lamare, e as minhas principais provas eram o 100 livre, 200 livre ( fomos para o pódium lembra?) 400 livre e os 100 borboleta. Durante o ano em uma competição nadei os 200 medley, e fiz 2.22. Nadei no primeiro dia após a eliminatória do 100 livre, e nadei para classificar e fiz 2.27. Ou seja me f…. pois fiquei com o nono tempo e nem final b tinha…..

      • rcordani
        27 de agosto de 2013

        Opa, bom te ver por aqui Hiran. “Nadar para classificar” nem sempre rende bons frutos… hehe

        Grande abraço.

      • Fábio Yamada
        27 de agosto de 2013

        Fala Hiran! Me lembro sim – o Hraldo Araújo ficou em primeiro, nadou pra 2’01, vc ficou em segundo com 2’04 e eu em terceiro com 2’05 alto. Tenho essa prova, copiei de uma gravação do Cheiroso. Aliás, alguém sabe do Heraldo?

        Pena, mas ainda bem que vc não classificou para aquela final!

      • Hiran Carlos Gallo
        29 de agosto de 2013

        Vc tem o vídeo destas provas do Brasileiro de 1987?

      • rcordani
        30 de agosto de 2013

        Hiran Gallo, o baú do JGM contém os 200P JuvB masculino (já postado) e os 200B Juv B masculino, prova ganha pelo de Poli.

  4. Fernando Cunha Magalhães
    26 de agosto de 2013

    Fahrner estava em Riccione no mundial de master de 2004. Rivalizou com Tite Clausi nos 100m livre,(40+) levando a melhor por poucos centésimos: 55s2 se não me engano.Acho que ele foi 3o e Tite 4o.
    Cumprimentei-o pela brilhante carreira e EVIDENTEMENTE não mencionei a prova de 400m livre.
    Mas juro que eu me sentia meio estranho, diria até, chateado todas as vezes em que o via circulando pelo parque aquático. Que carga para se levar por toda a vida.

    Lembro que no TB86 houve duas dessas em que o 9o ficaria com o bronze com o tempo da consolação: nos 400 medley, Renato Ramalho, controlou na 2a série das eliminatórias só para classificar – 4m51s – não acreditávamos o porque de tanto risco naquela soltura do crawl. O Léo ficou louco, os amigos incrédulos, ele saiu dando risada e o pavor dominou sua face quando viu que tinha mais uma série. Distraído, achou que eram só duas. Não deu outra: 9o. Na final B, 4m40s, o melhor da sua vida até então que seria suficiente para o bronze além de dividir o pódio com Djan Madruga, o vencedor com 4m35s.

    A outra aconteceu nos 200m borboleta: Carlos Vaccari fez o 9o tempo nas eliminatórias – acho que 2m09s alto, prova em que Tite Clausi classificou-se em 7o com 2m09s50. Na final B, Carlinho mandou 2m05s baixo que poderia ter lhe rendido o bronze, em prova vencida por Mattioli, com prata para Eduardo De Poli.

    Eu sempre melhorei meus tempos a tarde e nadei algumas finais B com tempos que seriam suficientes para classificar. Nenhuma vez daria para medalha.

    Muito bom o post!

    • rcordani
      26 de agosto de 2013

      Quem volta e meia ficava de fora nos 200P era o Cicero, e de tarde normalmente fazia tempo de pódium. O Rebollal também acho que ficou de fora algumas vezes e meteu tempo de pódium na final B.

      Comigo o máximo foi como você, Esmaga. Teria pego final A se fizesse o tempo da Final B de manhã. Aconteceu comigo nos 200B do TB de 1990 e nos 200P do TB de 1995.

    • Hiran Carlos Gallo
      26 de agosto de 2013

      Fernando. Não lembro o ano !! Acho que foi em 87, em que o Piccinini, ficou com o nono tempo na eliminatória e a tarde fez melhor tempo que o primeiro, Se não me falha a memória o tempo foi 55

      • Fernando Cunha Magalhães
        27 de agosto de 2013

        Não lembro dessa, mas em 87 não foi porque o Piccinini ainda estava nos 57s44.

  5. Rogério Romero
    27 de agosto de 2013

    Sempre achei a final B uma bobeira, muito diferente da semi. Se tem a chance e melhora a ponto de pegar final A, fica P. Se piora ainda mais, fica se questionando para que serve aquela P.

    No caso do nosso protagonista, lembro que nadar descontraído, sozinho, é beeem diferente de disputar o ouro olímpico. Não que ele não pudesse ganhar, mas quem imagina que o americano venderia barato em plena LA?

    PS: minha final B mais marcante foi a de Barcelona, quando pensei que a arquibancada iria cair quando Zubero, o falso espanhol, venceu os 200 espalda.

    • rcordani
      27 de agosto de 2013

      Bem lembrado essa da pressão menor. Com certeza esses 32 centésimos de diferença não podem ser tratados friamente.

      É interessante acrescentar que nos 4×200 o Michael Gross (do reveza do Fahrner) chegou a passar o Mike Heat, parecia que a Alemanha iria buscar o ouro, mas Heat conseguiu virar e bateu alguns centésimos à frente de Gross, deixando mais esse ouro escapar das mãos do nosso infeliz protagonista deste post.

    • rcordani
      27 de agosto de 2013

      Opa, por que o Zubero é falso espanhol?

      • Rogério Romero
        27 de agosto de 2013

        Citando o Albatroz antes, mais uma pova de que favoritismo é relativo.

        Quando à nacionalidade, ora, nasceu e treinou a vida inteira nos EUA, optando pela dupla cidadania por ser uma vaga em campeonatos internacionais mais segura.

      • Sidney N
        27 de agosto de 2013

        O pai é espanhol e ele tem dupla cidadania, mesmo tendo nascido e crescido nos EUA. Na época quase não dominava o idioma do país que representou e quando dizia alguma coisa saia com aquele sotaque de gringo.

      • rcordani
        27 de agosto de 2013

        Saquei.

  6. Lelo Menezes
    27 de agosto de 2013

    Comigo aconteceu num Finkel! Não lembro o ano! “Cozinhei” pela manha e fiquei em 9o. Quase morri! Cogitei pedir ao Munhoz para desistir na final (se não me engano estava na raia 8), já que praticamente não tinha chances de medalha (nadava melhor o 100m). Depois pensei melhor e achei que seria uma baita sacanagem fazer isso com ele e fui encarar a final B. Não lembro agora se meu tempo da final B dava ouro ou prata, mas sai p… da vida!

    • rcordani
      27 de agosto de 2013

      Lelo o seu caso é diferente. O sr. é peba, e pebas tipicamente pegam final B mesmo!

      • Lelo Menezes
        27 de agosto de 2013

        Peba nao…semi-peba! Ó o respeito aí!

  7. Daniel Takata
    28 de agosto de 2013

    Sensacional post! Conhecia a história, mas não as imagens. Os dois socos na placa ao final da prova são totalmente emblemáticos! Parabéns por mais esse resgate da história!

    • rcordani
      28 de agosto de 2013

      Obrigado Daniel. Também achei que os socos na placa dizem tudo.

  8. Daniel Takata
    28 de agosto de 2013

    Me lembro de alguns casos aqui no Brasil em que os vencedores de suas finais B venceriam ou pelo menos medalhariam nas respectivas finais A. O mais interessante aconteceu no Troféu Brasil de 1999, no Julio de Lamare. Inge de Bruijn, nadando pelo Vasco, nada a última série dos 100m livre ao lado de Flávia Delaroli. Inge vai no ritmo de Flávia, achando que bastaria nadar ao lado de uma das melhores velocistas brasileiras para se classificar. Flávia, por sua vez, vai no ritmo de Inge, achando que, estando colada na holandesa, não teria como não se classificar. De fato, tempos parecidíssimos (59.99 e 1:00.11), mas as duas caem para a final B. É quando Inge faz 54.92 e bate o recorde de campeonato, e Flávia faz 58.85, suficiente para o bronze entre as brasileiras. E por isso, minha irmã, que se classificou para a final A daquela prova, pode dizer hoje que um dia ganhou de Inge de Bruijn!

    • rcordani
      28 de agosto de 2013

      Boa. Em olimpíadas que eu saiba não há casos de tempo suficiente para medalha na final B fora esse do TF, ou você conhece outro?

  9. Daniel Takata
    28 de agosto de 2013

    Quando comecei a acompanhar natação, ficava com um nó na cabeça: como pode um cara nadar essa tal de final B e até vencer com recorde mundial que não vale nada? Imagino que essa confusão afete muitas pessoas que assistem a competições bissextamente. Conforme o Piu comentou, também acho a final B ruim para o atleta pelos argumentos apresentados por ele, e também acho péssimo para transmissão pela televisão. Ao menos agora nos campeonatos brasileiros as finais B são após todas as finais A e não são transmitidas (e nem deveriam mesmo).

    Final B é bem diferente de semifinal, mas sou contra ambos. Para mim, é o seguinte: somente eliminatórias (com as duas últimas séries fortes, e não três) e finais para todas as provas, e em revezamentos nadam os mesmo quatro atletas de cada equipe na eliminatória e na final. Simples assim. Acho que isso dá uma boa discussão.

    • rcordani
      28 de agosto de 2013

      Concordo com a sua proposta.

      “Final B” e “semifinal” servem no fundo para mais gente além dos oito terem a chance de nadar mais de uma vez. Bom para os pebas e semi-pebas. Para os Phelps, Lochtes e Haginos é péssimo!

  10. Daniel Takata
    28 de agosto de 2013

    É o Dr. Osmar narrando?

  11. Pingback: A despedida | Epichurus

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Publicado em 26 de agosto de 2013 por em Natação.
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