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MANOEL DOS SANTOS

Manoel dos Santos

Manoel dos Santos é o novo homenageado do Hall da Fama da Natação Brasileira. O texto abaixo de Pedro Junqueira conta um pouco para nós sobre essa história.

Manoel dos Santos foi o maior nadador brasileiro entre 1956 e 1962. O conjunto de seus feitos o colocou a frente de qualquer outro nadador na história da natação brasileira até então. Tal qual os grandes se desempenham, Manoel se destacou pelo pioneirismo de diversas formas. Ao fim do seu período de destaque competitivo, nosso espetacular velocista tinha elevado o patamar de notoriedade do esporte da natação no Brasil para um novo nível. Todos nós que viemos depois dele, pequenos ou grandes, usufruimos de uma natação competitiva local menos rudimentar e mais ambiciosa, pois foi o Manoel que nos ensinou que, sim, é possível galgar alturas inimagináveis e, para os nossos melhores, também chegar ao topo do mundo.

Manoel dos Santos se fez sozinho, orientado pelo seu técnico mestre Hirano. Sendo mais um paulista do interior, de saúde estremecida na infância, descobriu suas possibilidades de conquista do mundo através da natação. Teve grande desempenho nos campeonatos sul-americanos, a forte e motivante competição internacional dos nadadores brasileiros de todas as gerações até o final da década de 60. Penou nos dois pan-americanos que participou, muito em função da sofrível logística das viagens distantes e acomodações inóspitas dos nossos esportistas daquela época. Mas não deixou de brilhar em temporada internacional no Japão e marcar bela presença no aberto dos Estados Unidos, se destacando como pioneiro brasileiro em participações em competições internacionais entre os melhores do mundo em palco não olímpico.

Seus dois registros históricos de importância incontestável, e de maior conhecimento do grande público, foram seu bronze na olimpíada de Roma, em 1960, e seu recorde mundial, no clube Guanabara, no Rio de Janeiro, em 1961, ambos nos 100m livre, sua marca registrada. Poucos sabem de seu excepcional desempenho no sul-americano de 1962, em Buenos Aires, arrancando e liderando um inédito tricampeonato para o Brasil, em acirradíssima disputa com a estrela portenha, Nicolao, naquela que talvez tenha sido a competição na qual ele caiu na piscina em melhor forma na vida. Mas Roma e o Guanabara, por conta própria, comprovam mais do que o suficiente a feitura de um maior de todos, um mais rápido do mundo, um Hall da Fama.

O registro filmográfico da final olímpica supostamente se encontra nos arquivos em Lausanne ou Roma e o próprio Manoel, apesar do desejo, nunca teve o acesso e o prazer de assistí-lo. Aquela prova, descrita por suas testemunhas oculares, só pode ter sido cinematográfica. Urge a sua disponibilização para todos para que se possa conhecer melhor aqueles cinquenta e cinco segundos.

O registro filmográfico do recorde mundial nos mostra o limite do excepcional em 1961. O biotipo do velocista e sua sunga padrão, a ausência de oclinhos, a saída chapada trabalhada, as braçadas técnicas não patinantes, a desafiadora virada relando as pontas dos dedos na borda antes da cambalhota, a distribuição estratégica do esforço entre os quatro intervalos fundamentais de 25m. Ali, naquele momento, Manoel sintetizava o limiar do possível que a evolução humana e a tecnologia natatória permitiam. O resultado eram os espetaculares 53 segundos e seis décimos daquele ida e volta de piscina olímpica.

Quem não pelejou na piscina antes da década de 80 não pode conceber o significado daquele tempo. A barreira do um minuto nos 100m livre foi quebrada, no Brasil, no começo da década de 40, em piscina de 25 metros. Do final dos anos 40 até 1955, nadar abaixo de um minuto na piscina olímpica garantia um pódio em qualquer competição nacional e, não raro, em qualquer campeonato sul-americano. Na segunda metade da década de 50 Manoel começou a elevar a barra da natação brasileira, e pulando etapas. No começo nos familiarizou com os 56 segundos, depois conquistou reputação internacional de primeira linha com os 55 segundos e, finalmente, deixou sua marca indelével no quadro da história mundial com os 53 segundos. A partir dali, passou-se mais de uma década para que se começasse a se avizinhar novamente daquela marca em território nacional. A heroica geração que nos representou na olimpída de Munique, em 1972, e os nossos mehores velocistas durante toda a década de 70 não superaram convincentemente a velocidade de Manoel. Foi somente no começo dos anos 80, quase vinte anos depois de Manoel se aposentar da piscina, que os 53 segundos, de fato, começaram a não alcançar pódio em algumas de nossas melhores competições.

Manoel dos Santos fez brilhar aquela que era a pequenina natação brasileira, há mais de cinquenta anos. Desde então, ainda com Fiolo nos anos 60, e depois com Djan nos 70, Prado nos 80 e os mais recentes, a partir de Gustavo Borges, nos últimos vinte e poucos anos, deu-se prosseguimento nesta trajetória, que ainda é pouco povoada, de heróis da natação brasileira, esportistas excepcionais que se destacaram no mundo, alcançando o seu topo. Mas foi Manoel que começou, lá das épocas quando a distância de nosso atraso ainda era muito mais, ainda virtualmente insuperável. E ele nos mostrou, do fundo das impossibilidades, o que a cabeça de um real campeão faz alcançar. O nadador mais rápido do mundo. Cabe a ele, mais do que justamente, um lugar perene em nosso Hall da Fama.

Veja mais sobre os feitos de Manoel dos Santos no Hall da Fama da Natação Brasileira em mais um excelente texto de Pedro Junqueira.

Manoel dos Santos recebe sua homenagem na abertura das finais do Troféu Maria Lenk de 2014. Foto de Rodrigo Munhoz.

Manoel dos Santos recebe sua homenagem na abertura das finais do Troféu Maria Lenk de 2014. Foto de Rodrigo Munhoz.

 

Manoel dos Santos após receber sua homenagem, na piscina do Ibirapuera. Fonte: foto da assessoria de imprensa da CBDA.

Manoel dos Santos após receber sua homenagem, na piscina do Ibirapuera. Fonte: foto da assessoria de imprensa da CBDA.

 

 

Manoel dos Santos após receber sua homenagem, com Rodrigo Munhoz e Carlos Dudorenko - Foto de Ale Koizumi

Manoel dos Santos após receber sua homenagem, com Rodrigo Munhoz e Carlos Dudorenko – Foto de Ale Koizumi

 

12 comentários em “MANOEL DOS SANTOS

  1. rcordani
    28 de abril de 2014

    Putz, 53.6 há mais de cinquenta anos é fora de série mesmo. Na década de 80, 53.6 ainda era um ótimo tempo, pegaria quarto lugar no TB de 1982 por exemplo, mais de 20 anos depois.

    Quanto aos textos do Pedro Junqueira: esse aí em cima e também o texto mais completo no site do Hall da Fama estão sensacionais! E que um dia consigamos o filme da prova olímpica!

    • charlaodudo
      28 de abril de 2014

      Foi um tempo muito acima da época mesmo. Ao ver o filme exibido na ESPN eu fiquei imaginando como deve ter sido a pressão para nadar naquele caldeirão que virou a piscina do Guanabara, com toda a torcida muito próxima da borda.

    • charlaodudo
      28 de abril de 2014

      Vamos ver se o pessoal do arquivo olímpico consegue esse filme para nós. Deve ter sido uma prova sensacional essa em Roma.

      • Fernando Cunha Magalhães
        4 de maio de 2014

        Também estou na torcida pelo video.

    • charlaodudo
      9 de maio de 2014

      Renato e Smaga,
      Agora o video está disponível para todos. Um agradecimento especial ao Bruce Wigo, presidente do International Swimming Hall of Fame que se empenhou para deixar o filme disponível para nós.
      http://hfnb.com.br/roma-1960-final-dos-100-metros-nado-livre/

  2. Roberto Veirano
    28 de abril de 2014

    Eu não tinha noção dos feitos do Manoel antes de ler o ótimo texto! E fico muito feliz em ver o reconhecimento no Hall da Fama e também na homenagem prestada pela CBDA.
    Aguardo ansiosamente o video!!

    • charlaodudo
      29 de abril de 2014

      Eu também não conhecia muita coisa dessa história Veirano e foi ótimo contarmos com o Pedro Junqueira para compartilhar isso conosco. O Manoel também quer ver o video da prova!!

    • charlaodudo
      9 de maio de 2014

      Veirano, veja o video recentemente divulgado pelo International Swimming Hall of Fame:
      http://hfnb.com.br/roma-1960-final-dos-100-metros-nado-livre/

      • Roberto Veirano
        12 de maio de 2014

        O vídeo é fantástico! Obrigado e um grande abraço,

  3. Rodrigo M. Munhoz
    28 de abril de 2014

    Quando o Manoel dos Santos baeu o recorde mundial no Guanabara eu ainda estava há 11 anos de nascer… Mas ainda assim, como nadador décadas depois, sempre ouvi falar dos feitos desse grande mito das piscinas. Fiquei feliz de ver ao vivo a homenagem mais que merecida e aprender um pouco mais dessa história através do excelente texto do Pedro Junqueira http://hfnb.com.br/manoel-dos-santos/ .
    Abraços e Parabéns ao Manoel!

    • charlaodudo
      29 de abril de 2014

      Fiquei muito feliz também por poder prestar essa homenagem ao vivo e pelo apoio dado pela CBDA na competição.
      Obrigado Munhoz por registrar a premiação ao vivo também!

  4. Fernando Cunha Magalhães
    4 de maio de 2014

    Manoel dos Santos é uma pessoa muito querida.
    Certa vez, na década de 80, sentei ao lado dele na arquibancada do Parque Aquático Julio de Lamare e ouvi com detalhes a história da final olímpica.
    Outro ponto marcante foi a tristeza dele diante do amadorismo da época, ter tido que parar de treinar e competir para trabalhar com o pai.
    Ele poderia ter ido além, mas o ponto onde chegou já o coloca no Olimpo, merecedor de todas as homenagens.
    Sinto grande orgulho de fazer parte do Epichurus e do grupo do Hall da Fama da Natação Brasileira e poder prestar essa homenagem ao Manoel.
    Parabéns ao Charles, ao Pedro Junqueira – o texto está primoroso – e a todos os epichureanos.

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Publicado às 28 de abril de 2014 por em Hall da Fama, Natação e marcado , , .
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