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Natação e cia.

Quando um PEBA chega ao Olímpo depois de velho!

“A história é escrita pelos vencedores” é um dos chavões mais antigos que existem. E convenhamos, é bem verdadeiro. PEBAs raramente fazem história. Pouca gente entende que atrás de um campeão tem milhares de competidores que não chegaram lá e que ninguém jamais escreverá uma linha sobre o quanto treinou, o quanto sonhou e o quanto sofreu tentando. Se raramente lembramos do vice-campeão, o que falar do 16º ou 29º colocado?

Só que embora raro, tem vezes que um PEBA sobe ate o Olimpo, nem que seja por razões diferentes dos sonhos de outrora.  Imagino que ninguém tenha ouvido falar de Steve West. Talvez os mais atentos vão lembrar-se de tê-lo visto no meu último post, sobre Mike Barrowman, mas com certeza o nome deve ter passado despercebido para a grande maioria.

Steve West nasceu em 1972 e foi um nadador “PEBA”, entre aspas porque foi PEBA para padrões americanos. Se o cara tivesse nascido no Brasil certamente estaria no nosso Hall of Fame, afinal teria sido recordista sul-americano nas provas de peito, além de finalista olímpico, já que seu tempo na seletiva americana para Atlanta 1996 lhe daria a 7ª colocação nos jogos. Só que Steve West nunca foi para as Olimpíadas. Sua principal medalha foi a prata nos Jogos Pan-americanos de 1999, quando integrou a seleção B americana e seu melhor tempo alcançado na já mencionada seletiva americana para as Olimpíadas de 1996, onde Steve terminou os 200m peito em 3º, com 2’14’96, cinco décimos atrás de Eric Wunderlich, que conquistou a prata e consequentemente a vaga e sete décimos atrás de Kurt Grote, que venceu a prova com 2’14’22, quatro segundos mais lento que o WR de Mike Barrowman, quatro anos antes.

Steve West nadando o Campeonato Americano de Masters

Steve West nadando o Campeonato Americano

Steve abandonou a natação minutos depois desse 3º lugar. Entrou na competição convicto que integraria o time olímpico americano, sonho que tinha desde os oito anos de idade. E ele não era zebra não. Entrou na seletiva com o 2º melhor tempo nos 200m peito. Só precisava manter a posição e estava voando. Nos 100m peito, no primeiro dia se surpreendeu com a 4ª colocação com 1’02´78, ficando a apenas 2 décimos da prata. A vaga nos 200m, sua especialidade, estava no papo…

Mas infelizmente deu zebra…contra ele… Sabia que seria difícil bater Grote, mas não contava com a significativa melhora de Wunderlich. Ficou devastado com o bronze e abandonou o esporte.

Kurt Grote, Ouro no 4x100m Medley nas Olimpiadas de Atlanta

Kurt Grote, Ouro no 4x100m Medley nas Olimpiadas de Atlanta

West ficou seis meses fora das piscinas, mas não aguentou a aposentadoria. Trabalhando em período integral, achou tempo para treinar a noite, no mínimo quatro vezes por semana. Quem sabe com uma rotina com menos responsabilidades e pressões não surpreenderia a todos na seletiva Olímpica de 2000.

Encarar o esporte de outra forma pareceu dar resultado. Steve integrou o time principal americano para o Mundial de Curta de 1997 e novamente, dessa vez no time B, nos Jogos Panamericanos de 1999. Mas os jogos Olímpicos não estavam mesmo no destino do nadador. Na seletiva americana de 2000, Steve passou com facilidade para a semifinal dos 200m peito, mas durante a prova sentiu um estiramento na virilha e piorou bastante o tempo da eliminatória, não alcançando a final. Acabava ali, oficialmente, a sua carreira de nadador.

Casado desde 1998 e dono do próprio negocio, Steve passou a ter outros objetivos: prosperar seu negócio e crescer sua família.
Durante a próxima década, o objetivo foi alcançado, seu negocio foi de vento em popa e a família cresceu com o nascimento de sua filha Summer e no meio de tudo isso ele continuou se exercitando, surfando três vezes por semana e fazendo a ocasional musculação. Em 2009, alguns amigos de outrora lhe convidaram pra nadar uma competição de natação Master. Resolveu encarar e gostou da coisa e como já garantiram alguns epichurianos, não dá pra nadar Master sem ter objetivos e Steve foi nessa linha e traçou logo um bem forte: Bater o WR da categoria 35-39 anos nos 200m peito.

Inicialmente sua esposa Brandi foi contra a volta às piscinas, com medo que o marido voltasse a ficar obcecado pelo esporte e desse menos tempo a família. Steve então prometeu que apenas trocaria o surf pela natação e que nunca nadaria mais de três vezes por semana. E assim o fez… Até o final de 2011, quando West nadou o US Masters Championship e destruiu o WR nadando, na longa, para 2’20’34. Mas tem mais…

Dias depois da comemoração pelo WR, amigos descobriram que West, com esse tempo, havia alcançado o índice para nadar a seletiva americana para as Olimpíadas de Londres, de 2012 e ficaram lhe provocando para que nadasse sua 4ª tentativa Olímpica.

West a principio negou. Não queria competir como um tiozão ao lado de garotos com metade da sua idade. No entanto, quando várias colegas da natação Master vieram pedir-lhe pessoalmente que competisse, pois sonharam em nadar a seletiva quando jovens e nunca conseguiram, West acabou mudando de ideia. Por um ano ele treinou os mesmo três dias por semana, embora tenha aumentando a intensidade dos treinos.

Steve e esposa dias antes da sua 4ª Seletiva Olimpica.

Steve e esposa dias antes da sua 4ª Seletiva Olimpica.

Em 25 de Junho de 2012, Steve West, com 40 anos de idade, se tornou o mais velho nadador americano da história a competir a seletiva para as Olimpíadas. Nadou os 100m peito para 1’03’90 e terminou em 61º lugar. Três dias depois, nos 200m peito, nadou para a incrível marca de 2’19’47, 62º lugar na seletiva.  E não parou por ai…

Duas semanas depois, no US Masters Championship abaixou ambas as marcas para 1’03’76 e 2’19’01, ambas WR Masters até o presente momento. Ele detêm também o WR dos 50m Peito, com 28’55.

Não sei dizer se Steve West continuará nadando Master. Suas marcas foram todas alcançadas em piscina longa e na minha humilde opinião são praticamente impossíveis de serem batidas por outro quarentão.

Steve quase alcançou a gloria quando nadava profissionalmente, mas teve que esperar quase 20 anos pra fazer algo realmente impressionante na natação. PEBA? Bom, acho difícil chamar o cara de PEBA hoje em dia. Sou eu, com praticamente a mesma idade dele, que estou me sentindo um dos maiores PEBAs da historia!

14 comentários em “Quando um PEBA chega ao Olímpo depois de velho!

  1. Fernando Cunha Magalhães
    4 de julho de 2013

    Lelo,
    Pra mim o nome de West havia passado despercebido. Li neste post como se nunca tivesse ouvido, e achei a história sensacional. Que equilibrio esse rapaz alcançou sem precisar dizer que “ganhar nã é p. nenhuma”. Vários questionarão se o que você classifica como Olimpo, de fato é.
    Independente disso admirei muito essa trajetória e também estou me sentindo peba.
    Você conhece o West ou alguém que o conhece?
    Acredito que o cara iria se amarrar de ler a tradução da história dele a partir do google tradutor, vindo de um blog em português.

    • Lelo Menezes
      5 de julho de 2013

      Valeu Esmaga. O West nadou na Universidade de Michigan e é de 72, então grande chance de ser ou pelo menos ter sido brother do Pirula!

      Quanto a questão do Olimpo, concordo que tem gente que não vai considerar, mas pra mim um cara que faz 2’19 de 200m peito com 40 anos tem que sentar do lado de Zeus!

      • Fernando Cunha Magalhães
        10 de julho de 2013

        Boa Lelo… é vero!

  2. rcordani
    4 de julho de 2013

    Sensacional a história. Você sabe se para Sydney 2000 ele tinha real chances quando se machucou?

    E sobre o trecho que você colocou “não dá pra nadar Master sem ter objetivos”, meu próximo post é precisamente sobre isso.

    • Lelo Menezes
      5 de julho de 2013

      Valeu R.

      As chances eram minúsculas. 4 caras nadaram pra 2’13. O melhor tempo do West foi 2’14 (alto) de 1996, quando tava no auge e como ele já tava levando os treinamentos nas coxas, a chance de abaixar 1,5 segundos do melhor tempo beiravam o zero. Ele nadou a semifinal pra 2’18 quando sentiu o estiramento. As eliminatórias nadou pra 2’19 quando, segundo ele próprio, nadou na posição pra se classificar (corrigindo o que escrevi no texto, ele melhorou o tempo da eliminatória, embora tenha supostamente nadado com pouco esforço). Meu feeling é que se fosse pra final sadio ficaria na casa dos 2’16, longe das Olimpíadas!

      O interessante é que 8 anos se passaram e ninguém chegava próximo do tempo do Barrowman!

  3. Daniel Takata
    5 de julho de 2013

    Excelente! Como o esporte produz essas histórias improváveis e fantásticas. Em tempo, Steve West realmente foi colega do Gustavo em Michigan, tanto que fez parte da equipe que venceu o NCAA em 1995, que tinha Gustavo como capitão, e terminou em quinto nas 200 jardas peito. Entendo quando diz que se West tivesse nascido no Brasil teria sido finalista olímpico e etc, mas na verdade se ele tivesse nascido no Brasil dificilmente seu talento para natação teria sido descoberto pela falta de incentivo e toda a história que já conhecemos. Parabéns pelo texto!

    • Lelo Menezes
      5 de julho de 2013

      Valeu Daniel. É fato que não da pra garantir o que seria do Steve West se tivesse nascido no Brasil. Realmente a chance deter sido nadador é muito baixa. Provavelmente Estevão do Oeste teria outro rumo na vida…

      abs

  4. rbonotti
    5 de julho de 2013

    Muito bom, mas…. trocar o surf pela natação master foi uma péssima escolha na minha opinião…

    • Lelo Menezes
      5 de julho de 2013

      Depende muito. Se o cara surfasse como o senhor, que fica só boiando esperando “aquela onda”, de repente a opção de trocar pela natação master fosse obvia… rsrsrsrsrs!

  5. Rodrigo Munhoz
    5 de julho de 2013

    Putz, o cara é quase um ANTI-PEBA, Lelo! Gostei muito da história, da qual não fazia idéia… bacana que o cara é do mesmo ano que eu.
    Agora, vou te contar minha opinião… Dá sim pra nadar Master sem objetivos. Vamos ver em breve o que o Renato tem a dizer sobre isso. Sinto que vou ouvir… 🙂

    • Lelo Menezes
      7 de julho de 2013

      Boa Munhoz. Talvez de pra nadar Master sem objetivo, mas o pito que voce vai tomar do Renato nao vai ser leve nao

  6. Gustavo Borges
    9 de julho de 2013

    Lelo, o West eh um grande amigo. fomos roommates em Michigan e continuamos muito amigo ainda hj, estive com ele recentemente. O Texto esta otimo ele vai ficar contente quando sober disso. Um cara bem focado q durante sua vida em Michigan treinou junto com lendas do nosso esporte como Bman, Wounderlick, Namesnick, Wouda… Quando a turma do medley treinava peito era um espetaculo a serie. Se o West fosse Brasileiro certamente ele teria ido para Michigan pois tem um puta coracao Maize and Blue.

    • Lelo Menezes
      10 de julho de 2013

      Sensacional Pirula. Imaginava que vocês eram amigos, mas não sabia que foram roommates. Esses 2”19 que ele deu com 40 anos foi uma das coisas mais impressionantes que eu já vi na natação. Ironia OFF!
      Agora, não tinha me ligado como era forte o “peito” em Michigan nessa época. Alias, o medley também. Os treinos dessa galera devem ser legendários. Praticamente uma final olímpica em cada série. Espetacular!

      abs

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Publicado às 4 de julho de 2013 por em "Causos" fora d'agua, Natação, Olimpíadas e marcado , , , .
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