O Epichurus tem mostrado vários exemplos de como o mesmo momento no tempo é lembrado (ou esquecido) por diferentes pessoas, de maneira totalmente diversa. Graças a nosso leitor e colaborador Sidney Nakahodo, temos mais um desses casos, lindamente ilustrado com vídeo do longínquo ano de 1989. O Sidney nos conta:
“No final da década de 80 havia uma série de competições organizadas em diferentes regiões do país com formato semelhante à atual Copa do Mundo de natação. O Circuito Mesbla era disputado em piscina curta e contava com a presença dos nadadores melhores ranqueados nacionalmente. Havia duas séries para cada prova, a prata e a ouro, com os tempos mais fortes balizados na segunda. Com frequência os meetings aconteciam fora dos grandes centros, atraindo grande atenção nas cidades que os hospedavam.
Tive a oportunidade de assistir a uma de suas etapas no interior de São Paulo. O evento ocorreu em 1989 no Clube de Campo de Piracicaba e foi especial para mim por diversos motivos: a participação de vários atletas que haviam estado em Seul no ano anterior, a presença de futuras estrelas que começavam a despontar e o fato de tudo estar acontecendo na piscina onde começava a dar minhas primeiras braçadas competitivas pré-PEBAs. Lembro-me de ter pedido vários autógrafos, entre eles para um adolescente acanhado pouco mais velho do que eu chamado Gustavo Borges, ainda tímido com a tietagem.
Há cerca de um mês enquanto arrumava os arquivos, vi no meio da bagunça uma fita de vídeo com a etiqueta “Mesbla”. Cheguei a separá-la, imaginando que houvesse interesse do Epichurus em publicá-la algum dia, mas o material acabou voltando para o buraco negro. Logo em seguida, porém, tive o enorme prazer de ler a saga do Henrique Americano. O timing para “ressuscitar” a fita não poderia ser mais perfeito. Graças à nova busca empreendida pelos meus pais e à digitalização do conteúdo pelo Munhoz, conseguimos recuperar diversos momentos daquela competição nas águas piracicabanas, incluindo a famosa prova dos 100m costas relatado no excelente post do Cordani.”
No caso justamente do Renato Cordani, o interesse na fita era bem específico:
” Quando o Sidney disse que tinha o vídeo da Copa Mesbla de Piracicaba – 1989, foi inevitável procurar pela prova de 100 Costas. Segue aí no vídeo abaixo, com exclusividade do Epichurus:
Não sobrou muito a dizer sobre o Banana que eu ainda não tenha dito nesse post do mês passado. Mas, vendo o vídeo cometo mais dois pitacos:
1) O vídeo é do século passado, mas parece do retrasado! A piscina totalmente aberta e antiquada, os caras de sunga, sem touca, sem óclinhos, e batendo a mão antes de dar a virada de costas.
2) O exato momento em que o Banana decidiu parar de nadar tá integralmente registrado: os braços patinando no finalzinho da prova e a cara de dor + reflexão durante a soltura. Praticamente dá para ler na cara dele que desta vez passou do limite e não dá mais para continuar. Triste mas sábia decisão.”
Nesse momento divido com os leitores uma observação engraçada feita pelo Fernando Magalhães – o Esmaga: Após ver o video ele ficou contente que os costistas de hoje não mais desfrutem do privilégio de poder cair na água, soltar 15m ou mais e atrasar a competição por preciosos minutos extras. E complementa nosso colega epichureano sobre aquele evento:
“Lembro que fui a Piracicaba pensando em retomar os ótimos resultados que havia conquistado no primeiro semestre de 89, especialmente na Copa Vermelhinha e no Finkel, e que não havia repetido na primeira etapa do Meeting Mesbla em Niterói, consequência do rompimento dos ligamentos do tornozelo no fim de julho. Nadei a série ouro dos 50m livre e com um desempenho razoável poderia ter vencido ou no mínimo, ido ao pódio, mas nadei muito mal, fiz 24s43 e fiquei numa posição intermediária. Nos 400m livre, um alento, nadei na série prata, fiz 4m07s84, que achei bom, fiquei com o bronze e tive o prazer de dividir o pódio com os amigos Michelena e Grangeiro. Fora da piscina, não lembro bem se ficamos hospedados na faculdade, mas lembro que ficamos lá até altas horas. Amigos de vários clubes diferentes batendo papo e uma grande roda de piadas. Destaque para o repertório do Vladi e para as gargalhadas do Castor.”
Da minha parte, dizer que não lembrava de nada daquela competição seria um exagero. Mas nem tanto assim… Lembrava muito pouco. Faz sentido eu ter ido, com o time do projeto Kibon, salvo engano, a todas etapas. Mas confesso que fiquei até surpreso quando me vi na Raia 4 da “Série Ouro” dos 50 Peito, ao lado de velhos conhecidos, como Ricardo Benasayag, Vicente Pinho de Mello e meu (futuramente) compadre LAM – Luis Alfredo Mader.
Mas, hedonisticamente como de costume, me lembro mais de um dia bonito no Clube de Campo de Piracicaba, de amigos, do bate e volta Bauru- Pira, etc. Adicionalmente, quando vi a prova dos 50 Peito, lembrei de outra coisa não muito prazeirosa: A frustração de fazer uma saída lenta numa prova curta! Que raiva. Não que aquilo fosse fazer alguma diferença, pois nadei mal pra burro, mas o juiz era rápido no gatilho e eu nem havia agarrado o bloco quando foi dada a partida! E aparentemente não consegui acelerar -, ao contrário do Vicente ao meu lado, com seu estilo mega “picado” – excelente para uma passagem de 25 rápida. Pra completar o desastre, dei uma filipina meio longa na volta. Fechei “patinando” e acabei chegando em quinto ou sexto. Deu pra ver na minha cara depois da chegada que fiquei chateado. Não levara o mercantilista “prêmio em dinheiro”. Lembro que o 1o lugar (“100 Cruzados”) dava quase para comprar uma bicicleta nova… Tive que continuar com a minha Monark mais um tempo. O Benasayag ganhou, nadando na raia 6, com recorde brasileiro na época! Foi seguido pelo Vicente e pelo LAM. Acho que, para quem assistiu, foi uma prova interessante. Pra mim, foi mais uma daquelas provas horríveis no meio de treinos pesados na temporada. Mas a recordação de ver o Pirula ganhar o ouro nos 50 Livre com 23″98 e a dura disputa entre os meus amigos Cristiano Michelena e Marcelo Granjeiro nos 400 Livre foram impagáveis, fora os 100 Costas do Banana, agora históricamente documentados aí em cima.
Vejam aqui os vídeos: 200 borbo fem – ouro 400 livre masc – ouro 50 peito masc – ouro 50 livre fem – ouro
No fim, bateu saudade daqueles finais de semana de competição e principalmente de alguns ex-colegas de time, da Kibon e rivais-amigos, que não vejo há anos. Espero que especialmente estas figuras vejam este post e tenham boas recordações… ainda que, como eu, não se contentem tanto com a performance da época.
Que presentão legal Munhoz e Sidney !
Fiquei mais nervoso em ver o vídeo hoje do que provavelmente senti antes da prova na época.
De novo, agradeço a todos pelas manifestações e por tantas memórias boas !
Um grande abraço de muita amizade e gratidão. henrique / americano / banana
Henrique,
Foi incrível para mim também ver aquela prova de 100 Costas (em detalhes) descrita no post do Cordani surgir assim de repente! Graças ao trabalho arqueológico do Sidney e família! Fico feliz que tenha gostado e muito contente que esteja lendo o blog. Grade abraço!
Henrique, foi um enorme prazer contribuir com este post, principalmente depois de ter lido o artigo do Cordani. Não é sempre que encontramos uma homenagem pública tão sincera; a pessoa tem de ser especial para merecê-la.
Como o Munhoz mencionou, resgatar o video também foi uma maneira de compartilhar aquele momento a partir de nossas próprias perspectivas. Aliás a produção do texto coletivo por si só daria uma boa história.
Um grande abraço,
Sidney
Bacana o post!
Me ocorreu um ponto. Circuito Mesbla, Torneios JovemPan/Kibon (me lembro que a JP chegava a transmitir no rádio a competição e entrevistava a molecada depois das provas), Torneio Bob’s (acho que tinha também o mega revezamento) etc… É impressão minha ou a natação Brasileira regrediu em termos de quantidade de competições e patrocínio de grandes empresas (privadas)? Ou será que a natação progrediu e não existe mais espaço para este tipo de competição?
Abraços, Daniel
PS.: Sidney, Vc fez Poli? Acho que fomos contemporâneos. Abç!
Daniel,
Essa é uma ótima pergunta, que pode virar post no futuro próximo. Na minha opinião, as duas coisas aconteceram: A natação evoluiu (e muito) desde os anos 90 em resultados e no “topo da pirâmide”, colocando muito mais nadadores entre os melhores do mundo. Mas de um outro lado, o esporte regrediu em número de federados participando de competições, por exemplo (precisamos ir atrás de dados para comprovar isso ou não), grandes competições infantis já são mais raras e a formação da “base” (o que na minha opinião é o mais preocupante) parece estar mais lenta. Inclusive o Cielo comentou algo nessas linhas num artigo da FSP faz uns dias. Acho que pelo menos parte da regressão aconteceu porque o Brasil ficou muito mais caro e consequentemente esse tipo de evento ficou mais difícil de fazer. De qualquer modo, acho uma pena. Abraços e obrigado pelo comentário!
Excelente ponto Daniel. Também tenho a mesma impressão e é uma pena ver a participação diminuindo, ainda mais num momento em que a natação ganha cada vez mais projeção. Só não sei se a falta de apoio do setor privado é causa ou consequência para a queda no número de atletas nas categorias de base.
Sim! Será que chegamos a nadar juntos?
Abraços
Legal, Sidney e Rodrigo: obrigado pela resposta!
Sidney: na época da Poli eu fiquei mais no halterocopismo, mas sempre que possível acompanhava a natação e me lembrei do seu nome.
Grande abraço a todos
Legal Daniel, obrigado pela lembrança. Halterocopismo era uma modalidade muito popular na nossa escola 🙂 Um grande abraço
Opa, participei de vários INTERUSPs no halterocopismo e não fiz feio!
Muito legal o post, acredito que o fato de atletas como disse “os caras de sunga, sem touca, sem óclinhos, e batendo a mão antes de dar a virada de costas” ,simboliza a verdadeira natação, crua e nua,onde prevalecia a vontade, o dinamismo e a garra de vencer,portanto ao contrário….antigamente era futurista e hoje é o retrógrado com atletas biônicos que só querem saber de grana caso contrário não competem e que tem tudo de mão beijada como muitos super campeões que se acham , vida longa aos heróis do passado sim, antiquados pode ser, mas valentes sempre !!! Uma pergunta a todos, quem acha que hoje os atletas se submeteriam as condições do passado caso pudessem voltar no tempo ? minha resposta é….nenhum !!! parabéns pelo resgate amigos,espero que continuem postando vídeos daquela época,pois isso é motivação e mostra aos cyborgs de hoje o que era natação !!!
Abraços
Sueli Mendes Opratt
Oi Sueli,
Obrigado pelo comentário. Falando por mim, posso dizer que sim, o esporte, vencer, etc era o principal. Mas, sendo honesto, também queríamos uma grana, se possível. Mas não tinha muita, infelizmente 🙂 Nada no esporte vem fácil. Tenho certeza que mesmo o atleta mais mercantilista e materialista tem uma vida dura de treinos diários. Se não tiver, as chances do rótulo de “campeão” ir embora são altas… e isso sim, vai fácil. Mas pode deixar que sempre que surgir algo novo, vamos postar aqui! Obrigado pela audiência e pelo comentário!
Abraços Rodrigo, se puder ou tiver publique os resultados dessa competição para lembrarmos quem estava lá competindo nas mais variadas provas, assim lembraríamos de outros atletas da época.
Parabéns pelo texto e pelo vídeo, cinegrafista de primeira…
Aproveita e publica os 50 Pe tbém, acho q ganhei umas 40 doletas nesta prova
😉
Meu Caro LAM,
Você está lá no vídeo e realmente levou “o equivalente a US$ 40” pelo 3o lugar, como disse o narrador da competição. Lembra o que comprou com isso ?
O link pro video dos 50 peito está no texto, mas vou botar os videos na galeria também. Abração e vê se vai treinar! E vou cobrar sua ida pra Copa Vermelhinha, ok ? 🙂
Obrigado pelo elogio 🙂 Lembro que cheguei cedo para pegar um bom lugar na arquibancada e estava empolgado com a oportunidade de usar a filmadora novinha em folha.
Muito bom! Impressionante como eu não lembro dessa Copa Mesbla. Me lembro de nadar em Niterói, mas na minha cabeça foi o Torneio Claybon do Djan: Seleção brasileira x Seleção Americana x Seleção Russa se não me engano. De qualquer forma, muito legal esses vídeos!
Exatamente Lelo, em Niterói nadamos a Copa Cleybon Seleção Brasileira x Univ Michigan, que continha alguns russos. Mas isso foi em dezembro de 1992.
Nesse circuito Mesbla de 1989 que eu saiba nós não fomos para Niterói (e eu mesmo não fui nem para Piracicaba). No entanto, eu fui na etapa de Curitiba e levei meus 40 doletas e o bronze nos 200 Peito, o ouro ficou com o LAM e a prata com o Renalves.
Boa. É a memória Cordânica salvando novamente. Eu lembrava de ter ido pra Niterói nadar um Circuito Mesbla, mas o comentário do Lelo me deixou confuso. Pelo jeito o LAM levou uma grana da Mesbla nesse circuito! 🙂
Show… Isso representa 16.98% de tudo que recebi na natacao! 🙂
Boa, Castor! Mas você se refere apenas a parte monetária, né? Porque os amigos:.. Priceless!
Abraços!
Sem duvida meu caro Munhozzzz.
Muito legal, nadei as 03 etapas. Acho que estou neste vídeo dos 50m peito. Em Niterói, 100m peito, quem ganhou foi o Mader, fiquei em segundo, Este vídeo é uma pérola, parabéns! Abraços
Po Miguita…. 🙂 Você foi um dos que ganharam de mim nos 50 pto e depois nos 100 peito… Espero que tenha conseguido ver o video dos 50 peito! Seria legal achar videos das outras etapas também… e assim vamos reconstruindo certas memórias. Abraços!
Interessante o ponto da Sueli.
Lembro que quando tornei-me campeão brasileiro e finalmente comecei a ganhar algum dinheiro com a natação ao ingressar no projeto Mesbla, não havia absolutamente nada mais a acrescentar em termos de dedicação. Não existia suplemento, ou eu desconhecida, investia em algumas massagens e guardava o resto.
Legal Munhoz que você também achou o diploma.
Será que alguém leu o regulamento?
Sim! Em busca de uma foto de 89 pra ilustrar o post, inacreditavelmente, achei o diploma! Quem será que pegou 1o lugar geral das 3 etapas? Talvez o Castor? O LAM, que medalhou em todas pelo jeito era um dos top contenders, né?
E não… eu não li o regulamento, mas achei tão sensacional você ter guardado aquele treco todo, que publiquei na íntegra! Valeu, Esmaga!
Abraços e bom dia das crianças…
A de 1989 eu não sei quem ganhou o geral (mas deve ter sido o Castor com certeza). Em 1990 o vencedor geral foi o Rebollal seguido do Daniel Sperb e em terceiro a minha pessoa.
Acho que o Castor ganhou a edição de 89 e o Rebollal a de 90. Não chequei, essa é da minha memória. Cordani confirma?
Rebollal 1990 é certeza, Castor 1989 é muito provável.
Que lavada! Banana voou baixo nessa prova. Muito estranho ouvir meu nome associado a Mesbla e não ao MInas. Por mais que a Mesbla tenha dado uma forca, nunca me senti representando a empresa. O clube nos formou, pagou estudos, técnicos, médicos e viagens. A empresa surfou na onda e logo depois se mostrou falida. Modelo de patrocínio que provavelmente rendeu muito mais a CBDA do que aos atletas. Piracicaba foi uma caca níquel que, aos 21 anos, me fez repensar a hora de parar e estudar de verdade. Demorei mais dois anos, até disputar uma internacional com o Smaga que ansiosamente aguardo post – com titulo sugerido: Paramaribo, Suriname, o mundial de quatro nacoes e uma deusa holandesa. Kkkk abs.
Oi Cristiano! Interessante a sua perspectiva sobre a Mesbla. Pra ser sincero, apesar da gratidão à Kibon, eu também achava meio estranho ver o nome das empresas associados aos atletas… Agora fiquei muito curioso sobre este título desse futuro suposto post do Esmaga! Espero que chegue logo! Abraços!
Bom dia, estou realizando um trabalho para a faculdade sobre a rede de lojas Mesbla e gostaria de saber se este campeonato era feito pela loja ou patrocinado por ela? Agradeço a ajuda
Patrocinado apenas, Rafaela. Nas décadas de 80 até o início de 90 a Mesbla patrocinou muito a natação. Veja essa foto de uma competição de 1988:
Muito obrigada pela ajuda, foi muito útil, boa tarde