Lembro de uma série de 20×100 dentro de 1’20, num sábado de sol em Bauru. Era um treino normal, caminhando para um fim de temporada… Ia seguindo nem muito forte, nem muito fraco, o que na época significava nadar confortavelmente para 1’10 de média. O crawl, estava rendendo bem apesar de não ser meu estilo e o pulso não passava dos 140bpm. Lá pela metade da série, imagino que já estivesse um pouco entediado, quando lembro de pensar: “Esta série já foi dura, mas hoje está fácil. Eu provavelmente poderia fazer isso pra sempre…” – sem saber que eu já estava próximo do meu auge aeróbico e físico, aquela série se tornou um padrão de condicionamento para mim até parar de nadar a sério, anos mais tarde. Tinha uns 17 anos de idade e também não sabia que aquilo era meu primeiro encontro com o conceito de “forever pace” – aquele ritmo no qual achamos que dá para atravessar o oceano de uma vez.
Obviamente, meu ritmo fácil de mais de um quarto de século atrás hoje seria impossível de manter por mais que alguns minutos. Mas, aí que está a beleza dessa idéia: Esse ritmo eterno me parece um alvo móvel e adaptável ao seu instante de vida, ao seu condicionamento físico, ao seu humor e, claro, sua vontade. Acho, portanto, que cada um pode criar seus próprios parâmetros aqui. Na minha visão, esse ritmo tem que ser possível de ser mantido facilmente por mais de uma hora contínua – pelo menos. Adicionalmente, acho que o alvo não pode ser difícil demais, a ponto de passarmos mal ao fim de meia hora e nem fácil demais que não ofereça nenhum desafio.
Alguns amigos engraçadinhos chamam isso de “alisar a água”… E realmente, os ganhos de performance na natação competitiva vindos deste tipo de abordagem são no mínimo duvidosos. Mas, para mim, o negócio é simplesmente conseguir nadar mais.
Atualmente meu “forever pace” está entre 1’25 e 1’29 a cada 100m…Isso dá um pouco mais que 4km/h. Escrevendo isso, faço uma pequena pausa para passar vergonha. Passou. Cada um tem o tempo PEBA que merece. De qualquer forma, cheguei nesta estimativa com base em três pontos: 1) Meus treinos de ultimamente 2) Ajuda da tecnologia de um novo relógio que se tornou meu companheiro de treinos, e finalmente 3) Fazendo novamente os velhos tiros de “T30”. Para quem não sabe, o “T30” é um tiro de 30 minutos contínuos, no qual medimos a distância coberta. Nas últimas 6 semanas, fiz cinco “T30” e uma nadada longa no mar (7,3Km total), sempre mais ou menos no mesmo nível de esforço. Nos tiros de 30 minutos, cheguei a 2,125m em piscina curta. A nadada marítima, que foi uma ida e volta da Praia da Baleia até a Ilha dos Gatos (com pausa para tomar uma água e conversar com o único morador da ilha), serviu para me dar segurança para nadadas um pouco mais longas, afinal há quase 20 anos não fazia mais de 4,000m em um dia. Adicionalmente, me mostrou que meu ritmo em um mar calmo (ida) está mais ou menos em sintonia com a piscina, enquanto ondas e correnteza ainda que mínimas (volta) alteram bastante a velocidade. Duuuuh.
A verdade é que, apesar de ter mais que dobrado minha metragem média semanal desde o ano passado (estou chegando a fazer 15Km por semana), evoluí bem pouco até agora. O lado positivo é que os treinos e os T30 estão ficando cada vez mais fáceis. As análises destes tiros são novas para mim e podem ser interessantes para os mais curiosos, por isso estou anexando alguns gráficos no final do post. Se quiserem dar sugestões, lembrem-se que sou apenas um ex-peitista, que gosta de nadar medley e crawl, sem grandes objetivos além do prazer de nadar. O que me faz pensar que “evolução” aos 43 anos de idade não seja bem o que eu devia esperar… Mas também sou lembrado através do Canal Off – que comemora hoje o Dia Internacional da Mulher – que a Diana Nyad foi a primeira pessoa completar a travessia a nado de Cuba aos EUA em 2013, levando quase 53 horas na água, na sua 5ª tentativa. Uma baita história incrível de sonho, fracasso, resiliência e superação que atravessou três décadas. E ela tinha 64 anos na época que finalmente conseguiu… Isso que é “forever pace”!
Minha memória, como já deve estar abundantemente claro pros leitores do Epichurus, é seletiva. Não guardo muitos detalhes de provas históricas ou de momentos que, hoje dariam um bom post sobre os anos 90. Mas creio que guardei outras coisas, que apesar de mais banais e rotineiras, podem ter marcado minha vida e me tornado o que sou. Ou talvez seja justamente o contrário: Eu só guardei certas memórias por ser desse jeito desde criança. Acho que sempre me interessei por coisas capazes de se manterem no longo prazo… e, com exceção de um par de mal fadadas aulas no Clube Bandeirantes em Jacarepaguá, nas quais lembro de chorar muito (medo do professor), sempre encontrei prazer em nadar. Por muitos anos o volume de água que cruzei aumentou continuamente, até minha aposentadoria competitiva das piscinas em 1994. Ainda hoje, tem dias que eu queria poder ficar dentro d’água o dia inteiro, “alisando a água” na direção de uma borda distante. Pelo menos vejo que intuí corretamente e achei meu esporte ideal, já que “bordas” distantes não faltam. Quem sabe outras recordações ainda não estão por vir?
Boa Munhoz! Eu nunca tive esse conceito do forever pace. Nunca me passou pela cabeça, e hoje em dia tenho tentado dar umas braçadas, mas o ritmo de trabalho aliado a uma vontade quase nula de dar voltas na piscina tem me impedido de manter esse objetivo. Ou seja, na verdade somos bem opostos, você curte as longas metragens e eu tento achar algum estimulo para nadar, nem que seja por algumas viradas apenas…
De qualquer forma, seu post me lembrou daquelas séries longas e por que não dizer chatas da década de 80/90. Eram os 10×400, 5×800, 1×8.000, etc. Independente do Forever Pace, essas séries eram ótimas pra pensar na vida, repensar estratégias, etc. Com a vida atribulada de hoje em dia com mil responsabilidades, trabalhando muito, com filho em casa, tenho certa saudades desse tempo embaixo d’água, onde ficávamos “sozinhos” com nossos pensamentos. Existe uma “paz” bem bacana nesses momentos que acredito seja bem nítida para todos que nadaram por um bom tempo na vida…
Valeu, Lelo. Bem lembrado esse detalhe da “paz” encontrada nessas séries longas. E até que ajuda não ter um técnico gritando os parciais na borda, ou nem? Uma amiga chamava isso de “terapia da faixa preta” – se referindo ao bem que lhe fazia pensar na vida enquanto olhava para a faixa no fundo da piscina.
Quanto a sermos diferentes, acho que no momento seria mais “estamos” bem opostos, principalmente porque o senhor não está postando seus treinos… Te ajudo a “achar o estímulo”… esse estímulo é tomar umn chopp no Pinguim após dar um couro no Renato nos 50 Peito em Ribeirão Preto ! Ou não… e sofrer com a chacota!
Força aí, meu caro! Os Pebas precisam de ti!
Abraços!
Munhoz, interessante que você alardeia alisar a água e tals, mas quando faço série do seu lado o sr aparenta estar fazendo a maior força, e quase sempre ganha de mim com pernada 6 tempos no final. O sr. está usando a tática Buczmieijuc?
Caro Renato,
O Polaco se sentiria ofendido com essa insinuação! 🙂
Além do mais, faz meses que não ganho nada de nada…quanto mais com perna 6 tempos! Inclusive no T30, nunca te derrotei, que me lembre…
Mas que eu faço mais força quando tem PEBAs na raia ao lado durante o treino, isso eu faço! Até falo pra mim mesmo as vezes: “Deixa o cara se matar sozinho…”, mas não tem jeito… acabo entrando na pilha. Isso talvez valha um post no futuro. Valeu!
Este Renato Ranzinza so pode estar de brincadeira, Eu nunca usei esta tal tatica que voce expoe aqui aos seus leitores, Normalmente quando nao treinava muito, dizia a verdade, mas como devo ter sofrido de overtraining por tantos anos, mesmo que nao treinasse muito era suficiente para manter meus tempos Pebas…..Agora o senhor usou a tatica de dizer que nao treinou para o evento da travessia eliminatoria do mundial de Perth 91 e ficou degladiando quase que a travessia inteira comigo.
Munhoz, relaxa e continue alisando a agua, voce ja esta fazendo mais do que eu atualmente.
Polaco
Grande Polaco! Legal ve-lo por aqui! No Canadá acho que um esporte show de praticar seria o “Curling”, especialmente nesses tempos de frio recorde, hein? De qualquer maneira, espero que os leitores do Epichurus um dia conheçam mais detalhes dessa épica batalha pela vaga de águas abertas do Mundial de Perth… Abraços!
Boa ideia Munhoz, vou contar essa história aí um dia. Polaco, você tem fotos de Ilhabela-Caragua 1990?
Foto Renato, voce so pode estar de brincadeira, eu nao lembro nem de metade da prova, quanto mais ter fotos da travessia. Talvez o agora coach Indiani, possa ter algo registrado, ja que ficou me enchendo os pacova no barco que me acompanhava.
Munhoz, Curling nao da, talvez quando aposentar…….Agora se o Renato for escrever algo sobre a travessia, vou me esforcar para lembrar mais alguns detalhes……
Polaco, o Indiani foi contigo em 1989. Em 1990 – seletiva para Perth – quem estava no seu barco era o Alberto Klar. Mas serve fotos de qualquer uma delas.
Renato, o Alberto nunca foi no meu barco. Em 89, no meu barco estava Ogata, Banana (que comeu parte do meu suprimento para a travessia). Em 90 foi o Indiani com certeza.
pergunta para ele……
Munhoz, para fazer T30 tem que ter coragem. E pelo que vi, boas metragens no T30. Parabéns.
Obrigado, Oscar, mas o T30 é tranquilo se for alisando a água! 🙂
Munhoz, muito legal seu post. Queria falar sobre um detalhe que você citou: seu companheiro relógio. Em uma edição da revista Swim Channel fizeram uma matéria sobre relógios para nadadores, mas queria muito saber a opinião de nadadores experientes que os utilizam. Meu maior receio está relacionado ao desconforto e a possibilidade do acessório mudar a sensibilidade do nado ou “cansar” mais um braço do que o outro deixando o nado capenga. Pelo visto você está bem adaptado ao seu, mas sentiu ou sente algum destes incomodos que eu citei? Abs!
Oi Rodrigo!
Eu vi esta matéria na Swim Channel e achei muito boa. Agora minha opinião pessoal: Dizer que o relógio não altera em absolutamente nada meu nado seria mentira. Por outro lado, é algo mínimo e não percebi problemas até agora, sendo que já nadei 96Km com ele nos ultimo 3,5 meses. O Fenix2 é multi-esporte e “reforçado” – o que é ótimo para gente desastrada como eu – e pesa 85g. Não é super pesado, mas não é dos mais leves. Foi uma recomendação de um primo que faz corridas de aventura. O Garmin Swim (sem GPS, para nadar em piscina) pesa apenas 40g e tenho visto boas coisas de colegas que compraram. Se vc quer um relógio com GPS, outras opçoes da Garmin com caracteristicas similares ao Fenix2 são o novo Fenix3 (82g) , e os Forerunner 920XT e o 910XT (65g aprox). A Speedo, Suunto e a Polar também tem modelos interessantes, mas nunca usei nenhum, então não darei pitaco.
Por fim, minha recomendaçao é que se vc não nada com relógio algum, recomendo tentar uns treinos com um relogio qualquer a prova dágua e com cronometro. Treinar com relógio é bom para marcar tempo de tiros/passagens e guarda-los, especialmente quando não se tem um tecnico anotando tudo na borda (como eu). Tenha certeza que se adaptou, antes de investir em algo mais caro e sofisticado.
Note que na foto da travessia pra Ilha dos Gatos estou usando o Fenix2 no braço direito. Na volta, mudei para o lado esquerdo. Não que eu tenha sentido algo problemático, mas melhor prevenir do que remediar.
Obrigado pelo comentário e um abraço!
Munhoz, obrigado pelas dicas! Eu também treino sem técnico e acabo apelando para o cronômetro de parede que, na verdade, só me dá algumas estimativas, nada muito preciso. Gostei da ideia de tentar nadar com um relógio normal antes de investir num modelo próprio pra perceber a questão da sensibilidade. Vou tentar! Obrigado e bons treinos! Abs
Querido Carioquinha. Eu tenho um Garmin Swim e não me atrapalha em nada. Eu acho que, as vezes, eu atrapalho o relógio. Não entendo direito aqueles gráficos que ele coloca no computador. Só entendo de mulher grávida. No mais é uma ferramenta bem interessante pra quem treina sozinho. Se você tem uma equipe e técnico, acho desnecessário. Um abraço e quando vier a Bauru dê um toque.
Obrigado, Dr Zé! Não sabia que vc estava usando um Garmin Swim. Parece bom mesmo. Os gráficos são basicamente o que um técnico olharia> numero de braçadas, ritmo (ou pace – por 100m) e umas coisas que eu tbem não entendo… Em breve devo ir pra Bauru e te aviso. Abratz!
Munhoz, foi você quem escreveu o texto das goiabas? Gosto dessas viagens introspectivas. O texto é muito bacana, de alguma forma despertou a percepção de algo que eu já tinha esquecido.
Sim Niwa, fui eu que escrevi sobre as “goiabas de epicuro” – as quais por sinal voltaram a aparecer na piscina do Paineiras neste verão. Que legal que voce gostou! Um abração!.