Quando o ano de 1988 iniciou eu já era um nadador formado, bem diferente de um ano antes. Sétimo e quarto lugar nos dois últimos brasileiros principais, já não fazia mais sentido para mim o termo “Juvenil B”, embora eu ainda tivesse mais um ano nessa categoria. Nada de “age group”, eu era agora um nadador absoluto.
Foi exatamente nessa época que fiz a ligação para o Mario Xavier perguntando o índice olímpico relatada aqui, e de fato tinha uma micro-esperança de obte-lo já para Seul, e, se não fosse possível, ao menos me aproximar dele e consegui-lo para a olimpíada seguinte. Patrocinado pela Pro-Swim (só material esportivo, mas isso já era grande coisa na época) e convidado pelo técnico da Florida State University para treinar lá (não deu certo), eu vivia o (que imaginava ser) o início glorioso de uma vida de atleta semi-profissional, já que profissional mesmo na época pós Pradinho não havia nenhum!
Sim, paralelamente eu cursava bacharelado em geofísica na USP, mas a prioridade do curso na ocasião era totalmente secundária. Em primeiro lugar, o treino. Em segundo lugar, a dobra do treino. Em terceiro lugar a musculação. Em quarto lugar, acompanhar o vizinho Banana na fisioterapia do ombro dele, e, se ainda sobrasse algum tempo, passava lá na USP e assistia algumas aulas fazendo o máximo de esforço para não dormir (logrando pouco êxito nessa tentativa).
Todo esse esforço concentrado cobrou o seu preço físico: meu ombro esquerdo foi pro saco. Já em meados de abril não era mais possível treinar, e aproveitei o resto do primeiro semestre para consertar o ombro e estudar, ao menos no segundo semestre eu poderia voltar com tudo. O ombro até ficou bom, mas o segundo semestre também foi abortado devido à quebra das duas pernas, uma de cada vez, e a fratura do frontal (osso da testa) em um acidente no escorregador do clube durante o feriado de finados que me levou à UTI, depois mais uns 45 dias de molho até poder voltar a treinar.
Para turbinar meu sonho olímpico (adiado definitivamente para Barcelona), o período das Olimpíadas de Seul coincidiu com minhas pernas quebradas e com uma Greve de professores na USP, de forma que curti quase na íntegra Seul-88 pela TV. Eu passava as madrugadas acordado vendo os jogos, e ao assistir as provas de natação tinha absoluta certeza de poder estar lá em Barcelona 1992.
Consegui treinar apenas 40 dias para o Troféu Brasil de fevereiro de 1989 no Rio de Janeiro, cuja prova já foi assunto desse post no blog. Para esse TB a equipe do Paineiras lotou uma Caravan, e a delegação era composta pelo Pedro Editore (diretor), Nenê (técnico), Ana Cristina Lee, Lienne Carla Pires e eu.
A prova dos 200 Peito em si não teve nada de especial. Sem muito treino, nadei 100% de manhã, passagens certinhas, sem erros, e obtive a raia 3, o que me deu certa esperança para a final e diversos “parabéns” dos que sabiam dos meus acidentes na temporada. De tarde ainda melhorei alguns centésimos, mas uma melhora repentina e inesperada do Renato Alves tirou-me o bronze, o que de qualquer forma não chegou a me decepcionar. Quem testemunhou a surpresa de Alves foi o Esmaga, que o viu procurando um agasalho para ir ao pódium, agasalho esse que não estava previamente separado, provando que o pódium lhe era inesperado. O ouro para variar ficou com o Hermeto, e a prata com o LAM.
(Em retrospectiva pós fim de carreira eu constatei que apesar de ter treinado muito pouco para este TB, o fato de ter focado exclusivamente para os 200 peito foi benéfico, e quem sabe eu não devesse ter feito o mesmo nos outros TBs, ao invés de dividir os treinos entre Peito, Medley e Borbola?)
Eis o resultado final dos 200 Peito.
1- Alexandre A. Hermeto – CRF – 2:25.30
2- Luiz Alfredo Mader – CC – 2:27.84
3- Renato C. Alves – TTC – 2:29.15
4- Renato Cordani – CPM – 2:30.09
5- Rodrigo M. Munhoz – ALBB – 2:30.19
6- Marcelo V. N. e Menezes – CAP – 2:32.86
7- Ricardo Vaño Minguez – ECP – 2:33.00
8- Luis Carlos Miguita Jr. – ACEL – 2:34.05
Obs CBDA- Carlos Victor Araújo – 2:26.46
Desta prova eu guardo a certeza absoluta que eu iria me destacar futuramente nos 200 peito e me aproximar paulatina e inexoravelmente das olimpíadas de Barcelona. Caramba, treinando apenas 40 dias eu ainda era o quarto do Brasil, como não melhorar muito treinando decentemente? O céu (Barcelona) era o limite!
Sim, ok, eu fui quarto lugar de novo, que porre, PQP, mas desta vez a colocação estava mais do que boa.
Esperem só eu poder treinar um pouquinho…
…e vejam o que aconteceu na trágica parte III da saga.
Era bom visitar o Renato nessa época no hospital, pois inexplicavelmente ele ganhava chocolates do pessoal que ia visitá-lo, mas como ele não comia chocolate na época sobrava mais para os visitantes.
Charlão cuja faculdade também estava em greve, o qual aproveitou para adquirir 7kg de massa gorda comendo durante três dias os chocolates no hospital.
Eu me lembro desse acidente no escorregador do clube, e acho que você estava com 2 amigos, talvez Carlão e Arara. Mas nas minhas lembranças você era menor… O que um cara JuvB 2º ano, já na faculdade, estava fazendo no escorregador da piscina?
Sim, foi o ilíaco do Arara que fraturou meu frontal, repare que desde então fecharam aquele escorregador do CPM, a famosa cachoeira. E eu ERA menor, hoje tenho 42 anos!!
Renato, Não lembrava que havia perdido de tão pouco de você, nem de ter pego 5o nos 200 peito… dessa competição, só lembro bem do 2o nos 100 peito. O Cacá nadou para 2’26 na Final B ou de “extra”? Alguém lembra o que houve?
Munhoz, o sr. está com a memória muito ruim, não lembra de nada!
O Cacá estava mudando de clube, nadou na raia A (à direita) em observação pela CBDA para obter sulamericano juvenil (obteve). Três brasileiros nadaram peito naquele sulamericano JUV B, Cacá, Lelo e o sr.
Renato, tenho acompanhado o blog e quando conversamos no CPM há uns 2 anos, não havia ficado evidente seu dom da escrita, apesar de eu ter ficado impressionado com a sua resolução do ” cubo mágico ” rs…
Em função do momento ( filho atleta; pai diretor ) , é engraçado ver como a natação mudou … frase que o Sérgio Rezende usou na ocasião.
Como exemplo, os finalistas de Maria Lenk e Finkel, principalmente no masculino, raramente são juvenis.
Enfim , continuo aprendendo com as histórias do passado e me divertindo com vcs.
Forte abraço a todos
Carlos
Valeu Carlos. Grande Serginho, será que ele nos lê?
Com relação à mudança da natação, é verdade. Fico contente em mostrar como era.
E de fato os nadadores eram muito mais jovens. Na parte V (final) você verá que eu já era considerado um veterano com 21 anos, se fosse hoje em dia eu estaria apenas no começo da carreira com essa idade !
Renato,
Que ótima memória ! Não mem lembrava de quase nada, mas deste 200m eu me lembro que estava com enxaqueca. Mas estava feliz por estar na final.
Um abraço.
Valeu Miguita. Os resultados eu achei numa revista, inclusive tenho os da final dos 200P JUV A 1987 em que você foi bronze, quer?
Opa, claro que quero. Obrigado, um abraço . Miguita
200 Peito JUV A masc JD 1987
1- João F. L. Almeida 2:26.43
2- Rodrigo M. Munhoz 2:30.46
3- Luiz Carlos Miguita Jr 2:32.99
4- Marcio Santos 2:33.50
5- Carlos V. Araújo 2: 34.34
6- Luis Gustavo Milano 2:35.50
7- Flavio Albino Souza 2:35.71
8- Ricardo Vaño Minguez 2:37.27
Renato, muito obrigado pela sua memória refrescar a minha. Um grande abraço.
Meu caro PVC (Paulo Vinicius Cordani) q memoria fantastica e banco de dados idem !!! Soh fiquei na duvida se as pernas foram quebradas tb no escorregador ou em episodios diferentes. Na 3a parte da historia jah eh p ir providenciando os lencos ? Serah q houve alguma catastrofe maior ? hahaha
Qto ao agasalho do Renato, ele provavelmente acreditou q vc soltou de manha …
gr ab
Sim, pode providenciar os lenços, mas não use todos na terceira parte, guarde alguns para a quarta! As quatro contusões foram independentes, as pernas foram jogando futebol.
Eu nadei muito mal esse Troféu Brasil! Na semana anterior eu tinha nadado para 2’27″75 e consequentemente o ouro nos 200m peito no Júlio Delamare. Se tivesse repetido o tempo levaria a prata nesse TB, mas a principio nao me preocupei. Como tambem tinha sido prata nos 400m Medley no JD, eu estava tranqüilíssimo quanto a convocação para o sulamericano juvenil. Treinei o ano de 88 só pensando nessa convocação. Beirou a obsessão. Nunca mais treinei com tanta determinação quanto nesse ano. Só que quando descobri que o avulso Cacá tinha feito um tempo nos 200m peito melhor do que o meu ouro no JD, a minha certeza virou agonia. Quando o Cidão (Tecnico do Munhoz) me cumprimentou após a competição garantindo a convocação (minha e do Munhoz), eu agradeci mas voltei pro hotel pensando que o Cidão estava deveras otimista. Não consegui dormir naquela noite. Por volta das 6h, não agüentando mais a ansiedade, desci para o café da manha e fui beliscando uma coisa aqui, outra ali, esperando o William descer e anunciar a convocação. Quando ele desceu, deu bom dia pra todo mundo e não falou nada mais! Tive naqueles minutos a quase certeza da não-convocação e foram os minutos mais tensos da minha carreira de nadador. Eu congelei e não tive coragem de perguntar pra ele, talvez pra manter o fio de esperança que ainda me restava. O anuncio só veio no ônibus, a caminho de SP, minutos depois de sairmos do hotel. Consigo reviver aquele momento até hoje. Consegui coisas maiores na natação mas aquela convocação para o sulamericano juvenil foi talvez o momento mais feliz da minha carreira de nadador e aquela seleção Juv B em Rosário me traz lembranças sensacionais.
Sério, eu nunca entendi essa, como o sr. conseguiu piorar tanto em uma semana? Eu me lembro de você antes da prova olhando para o horizonte tipo quase rezando, acho que percebeu que não estava bem mas não queria por tudo a perder com ref. ao Sulamericano. De qualquer forma, achei excelente ganhar de você na ocasião.
Para quem não sabe, nessa época eu e o Lelo éramos adversários ferrenhos, a gente praticamente nem conversava. Só ficamos amigos quando o Lelo foi para o CPM no mês seguinte a essa prova.
Eu não tenho uma resposta lógica do porque de tão sensível piora apenas uma semana depois! Talvez tenha sido o polimento perfeito (o objetivo era o JD) e travei depois, talvez 10 dias comendo 100% do tempo no La Mole me enfraqueceram. O que mais acredito é parecido com a síndrome dos nossos olímpicos que focam na seletiva e não nos jogos. Eu treinei 88 inteiro pensando no JD. Eu mentalizei os 200m peito no JD 1000 vezes. O TB sequer entraram nos meus pensamentos naquele ano! Onde não há foco, não existe resultado!
Desde de janeiro de 1986, que foi quando te conheci, sempre achei que vc tinha como certo o objetivo olímpico, que pelo relato só aconteceu em 1988. Acho que a maneira que vc encarava os treinos e competições, diferentes do que estava acostumado em São José, me davam a sensação de que a forma que vc fazia era a formula correta para alcançar esse objetivo.
Melhorar eu queria desde sempre, mas sonho olímpico na real mesmo durou de 17/12/1997 a 31/01/1990, ops, já falei demais agora!
No comentário anterior me referi a um “objetivo olímpico” pois era como eu via vc treinando, “sonho” olímpico acho que é menos específico, dá menos trabalho.
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Boa. O Lelo tem o video dessa também?
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