Este blog já está em seu segundo ano e nesse período escrevemos quase 200 posts para você, leitor. Dito isso, peço licença para escrever um post sobre meus 400 medley só para mim. Isso mesmo que você ouviu: o presente post definitivamente não lhe interessará, a não ser que você seja o Renato Ramalho, o Daniel Sperb ou a minha mãe.
Ocorre que a minha história pessoal com os 200 Peito foi feita sob medida para uma saga: começou com uma vitória, aí veio derrota, sangue, suor, lágrimas e, quando tudo parecia que ia realmente para o saco, consegui arrancar um epílogo decente e a história ficou com um roteiro semi-peba-hollywoodiano, perfeita para um blog de natação epichurístico.
Já os meus 400 medley partem do nada para o lugar nenhum.
O Nada.
Começando pelo nada, no ano de 1985: no segundo semestre deste ano a CBDA (CBN) resolveu introduzir essa prova para os Juvenis A. Com quinze anos eu era então nadador de 200 borbola e 200 peito, enganava no costas e no nado de fundo, mas além de tudo (principalmente) tinha saco de encarar aquela que o Munhoz chamou de prova odiosa. Nada mais natural que essa tenha passado a ser uma prova prioritária para mim. Estreei no Finkel de 1985 e fui desclassificado. Aí no próximo Regional (Regional era importante para nós, pebas) o Luís Fernando Baroni do Espéria estabeleceu o recorde paulista (que estava vago) com 5:08. No Regional seguinte eu dei o troco, ganhei e bati o recorde com 5:06.
(N. do A: e o Prado, não conta? Ricardo Prado é paulista e com a mesma idade minha e do Baroni meteu 4:31 nos jogos de Moscou 1980. Como o recorde paulista podia estar sendo disputado em 1985 na faixa dos 5:00? Talvez a Federação Paulista tenha considerado que o “Ricardo Prado não valia”, sei lá! O fato é que estávamos disputando um recorde meio fajuto.)
A próxima competição era o Paulista de Verão, e o Baroni se saiu melhor e estabeleceu novo RP com 5:05, o qual teria sido superado por mim (5:03) no JD do Golfinho caso eu não houvesse sido desclassificado de manhã por “nado submerso”, minha segunda (e infelizmente longe de ser a última) desclassificação (tive cinco importantes no total nessa prova). Mudamos de categoria e o recorde ficou com o Baroni mesmo.
Daí para frente essa foi sempre a minha segunda melhor prova, atrás dos 200 peito. Tradicionalmente eu ficava entre quarto e oitavo no Troféu Brasil (foram seis finais A em sete anos consecutivos entre 1988 e 1994, sem metal – melhor tempo em longa 4:40). Somando tudo a prova me deu boas alegrias, um total de sete (7) títulos paulistas, dois (2) recordes paulistas e a minha maior alegria all time de Finkel, que passo a contar com detalhes agora.
Foi assim.
O Bronze.
Por causa de uma série de problemas cheguei ao Finkel de 1989 balizado em uma série fraca. Nadei o mais rápido possível e embora surpreso por estar muito na frente fechei forte para garantir um bom tempo que ao menos me colocasse na final A. O tempo superou as expectativas, melhorei 11 segundos e fiquei com o primeiro tempo para a final. E como há muito tempo essa competição não era realizada em curta, bati o recorde do Finkel! No programa vespertino (que guardei) estava lá o meu nome.
Programa das finais dos 400 Medley do Finkel de 1989 – Recorde do Troféu pertencente a Renato Cordani.
Na final o pessoal evidentemente me atropelou, e eu entendi que nos 400 medley adulto você NÃO PODE forçar 100% de manhã, caso contrário não melhora de tarde. Fiquei em sexto, veja o resultado aqui.
Essa lição apliquei já no ano seguinte (1990) no famoso Finkel da Inflexão quando, escaldado, nadei de manhã bem mais fraco e obtive a raia 2 para a final. Na análise do balizamento pré-prova eu senti que uma medalha era possível e isso gerou um extremo certo nervosismo.
Balizamento da Final dos 400 Medley do Finkel 1990.
Eu estou na raia 2, entre o Lelo (3) e o Romero (1). O filme da prova estava no baú do JGM e o Epichurus a apresenta abaixo com exclusividade. Um show de Renato Ramalho, provavelmente seu melhor 400M all time.
Tenho algumas recordações desse dia: de nadar muito fácil e bem de manhã; do ultra nervosismo pré-prova (essa não foi nada boa); de no final dos 200m ser passado pelo Piu (nem essa); da sensação de nadar um excelente peito que me deixou na segunda posição, e principalmente tenho a nítida lembrança de na virada dos 300m sentir que a medalha era minha. Olha, eu nunca fui conhecido por fechar bem de crawl – ao contrário – e desta vez eu nem pensei na prata, dei de bandeja que o Daniel Sperb iria me passar, mas em quarto lugar estava o Lelo muuuuito atrás, simplesmente não tinha como ele me pegar.
O bronze estava praticamente garantido!
Mas qual o quê, o Lelo simplesmente não suportava me ver na sua frente, vejam no filme a incrível recuperação do cidadão! Lembro-me nitidamente de virar para os últimos 25 esperando dar aquela olhadinha básica e ter a confirmação que o bronze estava na mão, mas ficar horrorizado com a proximidade do Lelo e a iminência da perda do metal, menos de seis meses depois da Tragédia do Ibirapuera, quando o miserável me passou nos últimos metros. De novo não! Fiz os últimos 25m desesperado (dá para ver no filme) e bati uns poucos décimos na frente dele, obtendo o bronze que é minha maior alegria all time na curta e meu segundo recorde paulista nessa prova. Não lembro muito do pódium, e infelizmente não tenho uma foto do mesmo.
Resultado Final:
1) Renato Ramalho 4:19.20 (Recorde Brasileiro e índice para o Mundial de Perth)
2) Daniel Sperb 4:31.20
3) Renato Cordani 4:31.92
Em 1991 fui 17º nos 400 medley (4:42) na Universíade de Sheffield. Em 1992 na mesma piscina mágica do Inter de Santos eu faria meu melhor tempo em curta 4:29.05, possivelmente meu melhor resultado ever (considerando todas as provas), e em 1993 eu obteria o 14º lugar (Final B) na Universíade Buffalo 1993 nesta mesma prova (4:44 de manhã, 4:46 de tarde).
E finalmente, do nada, chegamos a lugar nenhum (mas com algum recheio…)
Boa R. Lembro bem dessa prova e principalmente do Renato Ramalho meia piscina na frente. Me lembro de virar pro peito e vê-lo um quilometro a frente. Não lembrava no entanto da minha reação no crawl! Esse Finkel me marcou bastante porque dias depois eu partiria para treinar em definitivo nos Estados Unidos, onde com certeza me tornaria campeão olímpico…. só faltou acreditar!
Nesse dia antes da prova aconteceu alguma coisa (não sei se foi no equipamento, no microfone) e a gente ficou lá na cadeirinha atrás da baliza por intermináveis minutos. Se fosse chutar hoje eu diria que a gente ficou uns 15 minutos ali esperando, e evidentemente a tensão estava quase insuportável. Se eu já tivesse um blog na época eu ia estar repassando o texto a ser escrito…
Caro Renato,
Em primeiro lugar, eu diria que esse seu post interessou a muito mais gente que você dá a entender. Lembro de quebrar um recorde paulista de 400 Medley Juv A… será que era seu ou do Baroni? Tudo entre amigos… Sensacionais as imagens e como sempre, as lembranças daquele Finkel. Impressionante o que o Ramalho abriu de distância do grupo – me lembrava dessa prova mais pelo tempo impressionante que ele deu 4’19 e da contagem (torcida na verdade) do Mario Xavier no final – que foi impagável. Boas lembranças de competições e de provas rápidas naquela piscina do Inter!
Aliás,em breve vou, com outros Pebas, matar a saudades da piscina na Copa Vermelhinha… mas nada de 400 medley, pelo bem da saúde de todos!
Abraços!
As contagens do MX eram sensacionais! Óbvio que só se justificava pois não havia display do placar.
E essa do Recorde Paulista que você bateu não era o do Baroni não, pois você ascendeu a Juvenil A apenas em 1987, portanto alguém em 1986 já havia feito o serviço. Obviamente que “o Prado não valia”…
Ao contrário da nota do autor, esse texto me interessou muito, não sou sua mãe, nem seus adversários. Seu texto é muito bom, cômico, essa resignação misturada à determinação, competitividade… deu pra imaginar tudo, mas eu estava lá nesse dia, assistindo. Adorei a piscina mágica do Inter, pq sou santista e competia muito lá e meus últimos anos como nadadora foram no Inter. Parabéns!
Valeu Adriana, aquela piscina era mesmo espetacular (deve ser ainda). Meus melhores tempos em curta são quase todos de lá!
Ah, e seu blog é muito legal, sou leitor assíduo (menos o post sobre os signos…) 🙂
Eu sou sua irmã, não sei se não conta, mas eu gostei do texto! Não gostei muito do filminho, porque quem filmou só pegava o Ramalho nadando, e eu não sou irmã dele!
Podicrê, para me ver ali na 2 tem que fazer uma certa ginástica. Mas de qualquer forma foi sensacional (para mim) assistir essa prova tantos anos depois, mesmo de canto de olho. Já o Ramalho, realmente nesse Finkel ele estava voando.
Bom texto. Falando dessa prova especificamente, o Romero (ainda) não era ameaça? Se não me engano ele investiu nos 400 medley também e ganhou (ou pegou pódium) em alguns certames nacionais.
Ruy, em algum momento de 1992 o Romero começou a treinar para essa prova, teve uma evolução enorme e passou a ganhá-la (e isso deve ter sido bom para o MTC e ruim para os 200C dele, creio).
Teve alguns TBs e JF que ele chegou a ganhar quatro ouros (os 100 e 200C, e os 200 e 400M).
Mas em 1990 eu ainda lhe era páreo nos 400M, e nessa competição especificamente ele não estava muito bem (coisa rara).
Sim, sim. Na verdade, nem me lembrava que nadava esta prova tão frequentemente. Praticamente duas provas distintas, na curta e na longa, esta mmmmmuito mais sofrida. A programação medley-costas ficava pesada, por isso não consigo entender como Phelps e Katinka (para ficar apenas nos dois) conseguem estes resultados todos com a semi ainda para piorar!
Parabéns pelo post.
Piu, pensando em retrospectiva, talvez fazer treinos de medley entre 1992-1996 prejudicaram seus 200C, que melhoraram bastante pós-Atlanta.
Valeu, Cordani! Belo texto e ótimo recheio. Forte abraço.
Enorme Orselli campeão mundial, um abraço para você também.
Eu gostei muito!
A N do A está impagável e a descrição muito rica.
Nesses 400m medley temos o Cheiroso torcendo de costas a cada virada na cabeceira oposta com o uniforme do Flamengo.
Foi a 1a competição após a dissidência do RR e do Castor do CC e eles deram um verdadeiro show. Pena que o Castor não poliu e raspou, pois teria sido um espetáculo ainda mais grandioso… logo em seguida veio a cirurgia do ombro. Ih… saí do foco.
Volta aos 400m medley. O Renato e eu tínhamos uma cumplicidade e companheirismo enormes. Quando perguntavam se éramos irmãos, eu respondia: “não de sangue”. Assistir novamente esse show que ele deu foi muito bacana. Os 8 melhores do Brasil enfileirados e o sujeito abre aí, uma distância de… 12 segundos. É mole?! Esse recorde durou muitos anos.
Legal que na mesma prova, caro amigo Cordani, você tenha alcançado seu bronze. Que bom que o Lelo não pegou e a vitória sobre o outro RR, é um belo ponto no currículo.
Concordo com o “do nada” e com o “algum recheio”, já o “lugar nenhum”…
Valeu Esmaga. Confirma que foi a melhor prova do seu irmão não de sangue?
Acredito que o resultado mais surpreendente dele foi 4m41s no sulamericano de 1985. Agora, a melhor performance da carreira em termos de ranking mundial pode ter sido essa ou talvez o 2m05s na longa em 1992.
Ótimo texto. E adorei [não] me ver assim que acaba o borboleta – um verdadeiro PEBA na raia 8! Nem lembrava mais disso. Abraços,
Hehe, Veirano, era de praxe o cara que entrava em oitavo nos 400 medley sofrer para completar a final!
tá bem legal este acervo do JG…
Realmente o acervo é tóis, sobretudo para os adversários do Lelo.
Agora veja no filme DEPOIS que o Ramalho bate o recorde e faz o índice do Mundial, o Hermeto sorrindo na arquibancada. O Hermeto deveria ter nadado essa prova, mas se machucou no dia anterior durante os 200 medley, e abriu caminho para a medalha do Mitropoulos nos 100 peito e para o meu bronzezinho acima descrito. No dia seguinte, ele ganharia os 200 peito. Obrigado Hermeto por se poupar nessa prova! 🙂
Fantástica descrição da prova! Dá até para sentir a tensão e imaginar o desespero com o Lelo encurtando a distância. Espero continar encontrando outras “histórias-que-não-interessam-à-ninguém” aqui no Epichurus. Abraços
Valeu Sidney! Pelo menos aqui na comunidade epichuriana (incluso o sr) a gente tem uns três ou quatro interessados! Grande abraço!
Renato, sensacional, lembro muito da nossa disputa que começou em um regional em 1981
voltando, começou com 100 peito, onde vindo do campeonato paulista de estreantes logo na primeira serie bati o recorde paulista e voce bateu logo em seguida na ultima serie dessa prova,dai pra frente foi so disputa, obrigfado pela lembrança abs
Exato Baroni, abril de 1981 no Defe da Água Branca. E claro, depois na arquibancada do Palestra!
Abraços
Cordani! Meu caro! Mais uma vez. Parabéns pelo texto e pelas lembranças. Fiquei cansado novamente só de ver!!
Realmente Daniel, dá uma canseira só de ver! E você se lembra de alguma memória da prova em si?
Grande abraço.
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