EPICHURUS

Natação e cia.

A vitória é uma droga. Use-a com moderação.

Amigo leitor, considere esses três (aterrorizantes) trechos.

Nadador 1.

Por quase cinco dias no outono de 2014, o maior medalhista olímpico da história permaneceu deitado em posição fetal na sua casa em Baltimore, cabisbaixo e temeroso, envergonhado de seu próprio comportamento e com o futuro nebuloso. ‘Eu estava realmente mal… não queria permanecer vivo’

Nadador 2.

Minha doença era tão severa que, às vezes, eu considerei o suicídio. Eu acredito ser meio normal que pessoas pensem sobre se matar porque é parte do grande enigma da vida e morte, mas a diferença entre esses superficiais e inquisitivos pensamentos e aqueles que tive nos meus períodos mais difíceis é que eu cheguei a dar o próximo passo, planejando como e onde fazê-lo… De repente, as notas de suicídio na minha cabeça começaram a parecer racionais. Eu precisava de ajuda.

Nadadora 3.

Eu passei a tarde de ontem no chão do banheiro do meu quarto no Centro de Alta Performance em  Sierra Nevada, planejando me matar. Enquanto o resto do time comia, falava, jogava bola ou assistia TV, eu pensava sobre cortar meus pulsos. E minhas pernas – eu não esquecia minhas bizarras e talentosas pernas. Eu tinha decidido que deixaria aquele local em um caixão. Primeiro, as pílulas para dormir, daí me corto. Os pulsos, as pernas. Vou me cortar e pintar o quarto de roxo escuro, como as noites de Sierra Nevada…

O leitor atento que andou lendo a YesSwim nesses dias ou mesmo a Sports Ilustrated já sabe que o nadador 1 é o Michael Phelps.

O nadador 2 não conseguiu tantas medalhas olímpicas quanto Phels (afinal, ninguém conseguiu), mas tem um bocado de douradas em casa: trata-se de Ian Thorpe.

A nadadora 3 é a única que rivaliza com Thorpe no número de medalhas da natação australiana: assim como o Thorpedo, Leisel Jones tem 9 medalhas olímpicas.

Em comum além do talento e das inúmeras medalhas olímpicas, os três nadadores acima bateram recordes mundiais de longa muito jovens (com 15, 16 e 17 anos respectivamente) e tiveram fortes sintomas de depressão, dois deles relatando com detalhes e em livros escritos na primeira pessoa episódios em que pensaram efetivamente em suicídio.

Face aos trechos apresentados acima é quase irresistível formular a hipótese de que “ser recordista mundial tão cedo pode levar ao suicídio”, hipótese essa que certamente não conta com a comprovação científica e estatística nesse texto, mas que no mínimo merece reflexão.

Veja o caso muito diferente do Mike Barrowman (aqui). Ele camelou durante muitos anos, galgou degraus um a um, conseguiu a vaga olímpica e ganhou o ouro com recorde mundial aos 21 anos, parando de nadar em seguida com a seguinte justificativa “eu ganhei o ouro olímpico com recorde mundial. Não consigo pensar uma maneira de superar isso.”

“Eu ganhei o ouro olímpico com recorde mundial. Não consigo pensar uma maneira de superar isso.”

Superação

Essa palavra tão na moda talvez seja a chave aqui. Se o sujeito atinge o topo com tão pouca idade, o que lhe fará sentir “superação” novamente? Outro recorde? Outra medalha? E que tal um “recorde de medalhas”?

Mas não é só isso. A pressão por essa superação é acrescida da pressão típica que todo nadador sente no bloco antes da prova. Ian Thorpe definiu a sensação desta forma:

Estar na beira de um abismo preparando para saltar (no bungee jumping), com seus instintos gritando que você está prestes a morrer é muito menos tenso do que estar perfilado no bloco para a final olímpica.

Como dito acima, apenas com os dados que apresento não é possível provar que Leisel, Michael ou Ian não teriam os mesmos problemas caso não fossem nadadores extraordinários e não tivessem que lidar com esse tipo de pressão extrema, mas parece bastante verossímil que a busca pela superação o tempo todo desde muito cedo tenha sido o estopim para sérios problemas psicológicos.

A analogia com os bilionários que continuam correndo atrás de mais dinheiro ou de viciados em drogas que passam todo o tempo pensando na nova dose que irão tomar é muito forte.

Não estou propondo que (como Barrowman) todo mundo pare de nadar após o primeiro ouro olímpico, inclusive porque há fartura de contra-exemplos, pessoas que conquistaram muito e (até onde sabemos) não tentaram se matar.

Mas a vitória é uma droga. Use-a com moderação.

Sobre rcordani

Palmeirense, geofísico, ex diretor da CBDA e nadador peba.

29 comentários em “A vitória é uma droga. Use-a com moderação.

  1. Lelo Menezes
    23 de novembro de 2015

    Engraçado que ao ler o artigo do Phelps na Sports Illustrated o que me chamou a atenção, ao contrário do Munhoz que percebeu a milhagem dos treinamentos, foi a depressão. Eu pensei na hora “Como um cara que tem 18 medalhas olímpicas de ouro, milionário e considerado talvez o maior atleta da história de qualquer esporte pode estar deprimido pensando em não viver mais?”

    E aí me veio um realização interessante e assunto que seria (agora já não tenho tanta certeza) o foco do meu próximo texto. A taxa de suicídio entre jogadores profissionais da NFL é altíssima. Nós últimos anos foram 2. Como podem se matar atletas milionários, famosos, e com tanto sucesso?

    O que eu acredito é que quando se chega num patamar tão alto, vem o vazio. Não tem mais pra onde ir e mais importante, não tem mais o que sonhar. Veja que diferente de objetivos, sonhos são só isso mesmo, sonhos. Algo que nos permitimos talvez pra fugir da nossa, as vezes difícil, realidade.

    Por isso que eu jogo na megasena. Não é pra ganhar! É pra ter o sonho do que fazer com 200 milhões. Os 15 minutos caminhando de volta ao trabalho sonhando com aquela grana, as viagens, a casa na praia, o carro sport, valem os R$ 3,50. Quantas vezes após 1988 eu sonhei eu levar o ouro olímpico, passando o 100m em 4o, os 150m em 2o e buscando o Barrowman na batida de mão, com direito a WR. Que saudades desse sonho e são esses que no fundo sabemos que são praticamente inatingíveis embora matematicamente possíveis em conjunto com aqueles bem mais realistas que viram objetivos que nos fazem irmos em frente.

    O Phelps, convenhamos aqui, vai sonhar com o que mais? Que objetivo pode ter um cara que tem 18 medalhas de ouro olímpicas? Ganhar 19 faz realmente sentido? Faz diferença? Eu acho que não!

    • felipecasas
      23 de novembro de 2015

      Lelo, desculpa usar o espaço aqui pra coisas fora do assunto mas vi aqui a oportunidade…

      vc ja comentou a respeito de futebol, como foi gostoso ver palmeiras e alt-pr com seu filho recem nascido! bom, eu tive o mesmo prazer recentemente, alias to tendo jogo a jogo. mas vi palmeiras e fluminense, semi da copa-br com meu filho no colo…vitoria nos penaltis, que sensação hein? torcer pra quarta, isso se repetir 😉

      cuidado com a loteria, hein? diz a lenda que é mais facil sofrer algum acidente a caminho da loterica do que ganhar. a diferença é que ninguem noticia isso… so o vencedor!

      o michael jordan é exemplo parecido com isso. foi realizar o sonho do pai, que tinha morrido, foi jogar baseball ainda no auge da forma no basket, ne? acho que buscando motivação como boa parte dessa troca. fracassou, voltou, desaposentou a camisa 23 e foi campeão novamente. se ele repetir as performances desse ano, volta a ser campeao dps de uma aposentadoria!

      nao falei nada de natação.. foi mal

      abs

      • felipecasas
        23 de novembro de 2015

        ele repetir = phelps

      • rcordani
        24 de novembro de 2015

        Felipe, eu e o Lelo mais alguns chegados fomos no Palestra contra o Inter e contra o Flu. Possivelmente iremos contra o Santos também! Saudações alviverdes.

    • rcordani
      24 de novembro de 2015

      Hehe, esse sonho aí devia ser sensacional! O problema é que antes o sr tinha que fazer o mais difícil, que era ganhar da minha pessoa!

      • felipecasas
        25 de novembro de 2015

        po, legal, renato! vamos ver se um dia encontro vcs no palestra, ai passo de comentarista do blog a conhecido de verdade! abração e forza palestra

      • Lelo Menezes
        25 de novembro de 2015

        No meu sonho o sr. estava lá, em Barcelona, torcendo por mim das arquibancadas e chegou a chorar de emoção com minha vitória… hehehe

  2. Patricia Angelica
    23 de novembro de 2015

    Muito boa reflexão, Renato! Fico pensando, para além dos atletas de alta performance, no que fazemos conosco mesmos (pessoas normais, que executam trabalhos ‘normais’) e com nossos jovens e crianças…
    É tanta pressão pelo sucesso, por ganhar dinheiro, por ser magro, lindo, por ser o melhor no que quer que seja…
    Tenho lido que está sendo criada uma geração de pessoas que não suportam a frustração, pois sempre tem tudo o que querem/precisam antes mesmo de realizarem que querem/precisam. Mas fico pensando se, mais do que isso, não é essa mentalidade de concorrência, competição 24/7 que nos faz não “tolerar” a “frustração” (uso aspas pois, ao contrário de muita gente, não acho que não ser o melhor, o mais magro, mais bonito e mais bem sucedido seja uma derrota), mas justamente o fato de que ser “derrotado” é um fracasso tão grande que pode acabar com a pessoa…
    Acredito que assim como a vitória em si pode ser uma droga, a busca eterna e obsecada por ela também pode ser tão ou mais prejudicial…

    • rcordani
      24 de novembro de 2015

      Boa Patricia, concordo, e sobre isso gosto muito dessa canção:

  3. Marcus Mattioli
    23 de novembro de 2015

    Acho que somado a tudo que foi dito vale lembrar a rotiina duríssima e EXTREMAMENTE DOLOROSA de treinos que fazem parte do dia a dia de todos os nadadadores, e creia-me, só nadadores de elite conseguem imaginar o quanto de dor e sofrimento esses 3 ai se submeteram. Também deve-se levar em consideração que é muito difícil de achar qualquer outra atividade ou o que fazer que te faça sentir tão vivo e pleno como uma final de campeonato, olímpica então…
    Somado a isso vem as amizades feitas na borda da piscina, amizades consolidades no compartilho da dor, do sofrimento e das poucas, raras mas intensas conquistas!! Ai fica muito pesado para o atleta, que fisica e mentalmente não suporta mais o stress e a dor extrema dessa rotina insana, mas não vê e principalmente não sente em nehuma outra atividade profissional, lazer ou cotidiana que o faça se sentir tão vivo qto aqueles momentos, segundos antes do tiro de partida de uma final! Basta lembrar o que disse Phelps quando retornou de sua aposentadoria:: Férias é muito passante, chato e entediante!

    • rcordani
      24 de novembro de 2015

      Boa Mattioli, muito boa a contribuição de quem já esteve lá pertinho desses caras.

      E a sua solução para o “problema” (continuar batendo WRs) parece ter feito muito bem para você!

  4. laurivalshita
    23 de novembro de 2015

    Proponho um outro ângulo para a análise:

    Será que estes atletas não tinham problemas piscicológicos anteriores e justamente por isso se tornaram vencedores em um esporte onde a obsessão é um trunfo ?

    Acho que a relação de causalidade pode ser a inversa da proposta no seu texto.

    • rcordani
      24 de novembro de 2015

      Sem dúvida Laurival, a casualidade inversa também faz bastante sentido.

      Infelizmente essas hipóteses são difíceis de testar, era necessário que um Ian Thorpe vivesse da forma que viveu, depois rebobinássemos, e faríamos ele viver de novo com outro tipo de vida. Enquanto não houver máquina do tempo, será difícil testar isso aí…

  5. Rodrigo M. Munhoz
    23 de novembro de 2015

    Pelo jeito o artgo do Phelps vai render…
    Se ele foi sincero – e não apenas manobrou esse PR spin para criar mais empatia com a audiência – acho que há razão para preocupação com a saúde mental do cara sim.
    Sucesso no esporte pode ajudar, mas definitivamente não garante sucesso no mundo “real” e nem sanidade mental sem data de expiração.
    Não sei se sucesso no esporte atrapalha, mas nos casos brilhantemente citados pelo Renato parece que sim…

    Na minha opinião, parece que talvez algum disturbio pré existente tenha sido agravado pela extrema pressão sofrida e pelo enorme sucesso obtido por Phelps, Thorpe e Jones em suas carreiras.
    Me chamou a atenção uma notícia recente sobre uma medalhista olímpica, formada em medicina que hoje, diagnosticada como Bipolar, vive em um tralier e não consegue pagar suas contas (http://olimpiadas.uol.com.br/noticias/2015/11/16/atleta-medica-e-dona-de-medalha-olimpica-hoje-vive-em-trailer-infestado.htm). O cérebro é algo poderoso, e da mesma maneira que possibilita grandes conquistas, pode arruinar vidas e o faz com relativa frequencia.

    Me parece muito fácil acreditar que há uma falta de perspectivas na vida pós-natação no caso desses grandes astros da piscina. Suspeito que não seja só a “vitória”, mas também a rotina focada, a simplicidade de objetivos contados em metros e centésimos que lhes faça falta também… até porque os grandes campeões são muito raros e a depressão é relativamente comum. Pessoalmente, tenho bastante atenção e preocupação com doenças mentais. Acho que o avanço da medicina via nos permitir observar mais diagnósticos e mais tratamentos novos focados “na cabeça” dos pacientes. E nós que somos normais devemos ficar tão atentos quanto os fora de série para isso.
    Abraços!

    • rcordani
      24 de novembro de 2015

      “Distúrbio pré-existente agravado” é uma boa hipótese também, na linha do que disse o Laurival.

  6. Christian
    23 de novembro de 2015

    Eu acredito que todos na verdade busquem um sentido para a vida, algo que preencha um vazio existencial , algo que faça se sentir acolhido , amado , aceito sem “IF”. O que eu só vi preenchido por amor ( ágape) a alguém ,ou a alguma causa ( ideal).
    Todos estes acima mencionados, acreditaram que a vitória traria isso, mas quando chegaram lá continuaram com o vazio. Enfim, tinham feito tudo certo, mas pela razão errada!
    Um campeão pleno, tem de um lado a determinação e do outra compaixão ( algo que pode ser visto no Senna, quando parou para salvar outro piloto do acidente, ou Emil Zatopek que escondeu sua medalha de ouro na mala do corredor australiano, ( que ele admirava), no nosso maratonista Vanderlei Cordeiro, ou em Emanuel do vôlei que entregou sua medalha a Vanderlei.
    Enfim todos suportam qualquer dor, desde que encontrem um sentido nisso! Quando não encontram…., vazio !!!

    • rcordani
      24 de novembro de 2015

      Na mosca Christian. Olha, deve ser muito legal ser seu atleta, espero que eles (seus atletas) tenham consciência disso!

  7. Cristiano Viotti
    23 de novembro de 2015

    Muito instigante o tema e ótimos os comentários dos amigos que conhecem bem a dor e o esforço dos campeões. Acredito que pensamentos sobre suicídio e auto mutilação são reflexos de extrema dor e frustração. E talvez mesmo os maiores vencedores se sintam frustrados de vez em quando pois viver “apenas” para alcançar metas e resultados pode gerar um vazio existencial real, não só quando se alcançam essas metas e nada mais a alcançar, mas porque nossos valores mais profundos não se realizam apenas com resultados. Ao contrário, recordes e medalhas podem – nem sempre – iludir e esconder valores mais importantes de um ser humano, como o amor ao próximo (respeito, amizades, humildade, etc) e a si mesmo (dignidade, autruismo, superação, etc). Quem luta só para ganhar um dia vai querer perder para se provar normal se essa pessoa não tiver fortalecidos os demais valores humanos desde a sua infância. E perder ou se frustrar gera muito mais suprimento para os valores nobres do que só ganhar e nunca refletir. A dor dos treinos por si pode até piorar a situação, pois ao invés de alimentar a dignidade pode destruir a auto estima. Não sou psicólogo, posso estar viajando, mas é o que sinto da vida e das experiências. Grande abraço, e matar um treino ou outro ou preservar alguma rebelda saudavel pode ser uma grande saída desta enrascada.

    • rcordani
      24 de novembro de 2015

      Sim Cristiano, mas veja que no esporte amador ou semi-peba em geral a vitória em si não é nada. Para nós, hoje é uma medalha de ouro enferrujada na gaveta. Mas para os profissionais, um ouro aqui outro ali faz muita diferença (monetária), então a pressão deles é amplificada.

      A gente estava no primeiro caso.

  8. anonimo
    23 de novembro de 2015

    isso acontece com millhões de ninguéms no mundo inteiro. depressão e uma condicão patólogica devido ao desequilibirio hormonal ou enzimatico do cerebro. aqui simplesmente o uso da fama pra vender livro e aumentar o pé de mia. Mas a sports illustrated is hack jornalism então praque preocupar.

    • rcordani
      24 de novembro de 2015

      Verdade anônimo, mas veja que a reflexão gerou ótimos comentários, afinal estamos aqui para isso, não é?

      • anonimo
        24 de novembro de 2015

        concordo. boa materia.

  9. Mário Sérgio Cardoso.
    23 de novembro de 2015

    Como ex- atlete ( triathlon ), posso afirmar que este assunto é muito complexo. A história mostra ex- atletas bem sucedidos em outras áreas, mal sucedidos no esporte e bem sucedidos após deixarem de competir, Deprimidos e entregues as drogas e etc…O problema é que o atleta realmente apaixonado pelo esporte, quando se aposenta. Sente falta dos treinos, competições e da idolatria dada pelo público em geral …. e isso que o perturba muito. Eu por exemplo, depois que abandonei o esporte competitivo, nunca mais sentir o prazer de ser bajulado e as vezes, endeuzado por todos. Isso me fez perder a vontade por todas as outras coisas da vida, nada mais importa. Muitos dizem que é sinal de imaturidade, mais não sei… Muitos são desmotivados pelas suas profissões, sem nunca terem tido alguma paixão na vida. Amar a sua profissão é muito importante para ser bem sucedido e feliz. Finalizando, o que acontece é o vazio que todos nos presenciamos quando paramos, independente das vitorias.
    Abs
    Mario

    • rcordani
      24 de novembro de 2015

      Obrigado Mario. Realmente a gente sente falta da adrenalina do esporte, mas quanto a isso dá para fazer uma meia sola competindo pelo master na natação ou entrando no age group no Triathlon, não é mesmo?

  10. Fernando Cunha Magalhães
    24 de novembro de 2015

    Vejo os casos de Phelps e Thorpe diferentes da Liesel Jones.

    O que os rapazes viveram, eu vivi e o Mário que comentou aí em cima, também.
    Lembro de uma longa turbulência após a aposentadoria das águas, sentir-me perdido por deixar um universo em que eu sabia lidar com quase tudo, tinha reconhecimento e conhecia os caminhos para a construção dos resultados e realização. Mesmo que não alcançasse na medida sonhada, como bem exemplificou o Lelo. Buscar, sem sucesso, o mesmo grau de performance em outras áreas da vida e sentir-se medíocre por isso – duvido que o Barrowman não tenha passado.

    Vivi a cena descrita pelo Phelps em minha cama. Tinha certeza absoluta que era impossível lidar com os problemas em que estava envolvido. Fui tirado de lá pela minha esposa e só consegui livrar-me das minhas auto-condenações com terapia. Vivo outro momento de vida. Em paz e valorizando os pontos bem levantados pelo Christian, e olha que eu não tenho a vida financeira resolvida como os dois.

    Estou certo que a minha terapeuta e a participação num grupo da SBDG, um processo de cerca de 2 anos, libertariam esses grandes craques de si mesmos, e eles poderiam desfrutar das infinitas possibilidades de realização que a vida e o mundo oferecem de forma entusiasmada.

    Já a Liesel queria se matar durante a fase de preparação para os momentos que os atletas mais almejam, com reais possibilidades de chegar lá, ou depois de já ter chegado. É bem diferente. Lembro de aos 15 anos, dormindo sentado no ônibus a caminho do treino, esgotado pela rotina, pensava em propor uma lei que proibisse os treinos de madrugada. Não sabia como lidar com tanto cansaço acumulado. Chegava na borda da piscina e esquecia isso tudo, submetendo-me ao que o Mattioli se referiu.

    No caso dela, ainda não tenho a clareza de como ela chegou lá e qual seria a forma de resolver, fato é que a terapia ajudaria muito.

    Se não me engano, o Gustavo Borges esteve envolvido numa comissão do COI para dar acompanhamento aos super-atletas para o processo de aposentadoria e contou-me sobre o suicídio de um super carismático goleiro de pólo-aquático espanhol, chamado Jesus (a certeza não é abasoluta).

    • Bárbara
      24 de novembro de 2015

      Não sou atleta de alta performance e entrei para o mundo das pequenas competições aos 35 anos de idade para superar as dores da alma e do corpo. Mas coloquei algumas metas desde então e muitas delas alcancei e percebi que quando chegamos no lugar mais alto do pódio, lá é um lugar onde só cabe UMA pessoa e mais ninguém. Lá no alto todos te olham mas só está você lá.
      Todos nós almejamos os nossos lugares mais altos do pódio e aqui me refiro a todos os setores das nossas vidas. Coloco pódio relacionando com os nossos objetivos. Somente com muitas análises e terapias, como citou Magalhaes, conseguimos enfrentar as vitórias e as derrotas desses “pódios” conquistados ou não.
      Ser mediano é estar na média. É ter muitos companheiros e talvez não se sentir tão só.
      Lidar com essa solidão de estar no alto, lidar com a “vitória” esta parecendo ser mais difícil do que com a “derrota”. E coloco entre aspas pois também não acredito que isso possa ser tão crucial na vida de qualquer ser humano.
      Saber encontrar a paixão e o amor pelas coisas, como também citou o Christian, para mim é o ponto que nos faz acreditar que vitória ou derrota, sucesso ou fracasso, é apenas parte do caminho, da travessia. E com certeza ter um bom treinador, professor, amigo, companheiro, terapeuta que saiba compartilhar isso é sinal de saúde mental, física, espiritual. É sinal de Vida!!!
      Será que na alta performance, onde visam os resultados, as medalhas, Os pódios, a conta bancária de toda a equipe envolvida, o atleta realmente interessa? Será que a vida futura dessa pessoa está mesmo em questão? Para quem interessa a vida ou a morte de um grande campeão?

      • rcordani
        24 de novembro de 2015

        Boa Bárbara, obrigado pelo comentário e por dividir suas experiências e pensamentos conosco.

    • rcordani
      24 de novembro de 2015

      Muito legal você dividir conosco sua experiência. Eu não experimentei esse “vácuo” pós aposentadoria, talvez porque tenha feito uma “parada técnica” no triathlon, ou por ser peba mesmo…

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Publicado às 23 de novembro de 2015 por em Epicuro, Natação, Olimpíadas, Saúde e marcado , , , , , .
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